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quarta-feira, 10 de maio de 2023

Vila Assunção já foi um dos principais destinos de veraneio dos porto-alegrenses

 Ida aos balneários da cidade era a forma mais facilitada de buscar sossego no verão, já que o mar do Litoral Norte era longe e dependia de viagem de carro

Ida aos balneários da cidade era a forma mais facilitada de buscar sossego no verão 

Resumo da matéria:

• Pedra Redonda era o principal point dos banhistas entre 1920 e 1970; Vila Assunça o segundo
• Balneários eram procurados pelo acesso facilitado por ferrovia
• Praia de Vila Assunção era chamado de "Balneário Aristocrático"
• Faixa de areia não existe mais. Arquiteto aponta alguns motivos pra isso
• Vila Assunção foi projetada para ser um bairro com praia
• A arquitetura californiana das casas do bairro
• Porto Alegre segue com duas praias próprias pra banho
 

Por décadas a Zona Sul foi destino de veraneio dos moradores de Porto Alegre e arredores. O deslocamento dos banhistas para os balneários teve início na década de 1920, impulsionado pela criação da ferrovia que ligava o Centro à região. Essa era a forma mais facilitada de buscar sossego no verão. O acesso ao mar do Litoral Norte demandava uma longa viagem de carro - e possuir um não era algo tão popular. Além disso, a construção da Freeway ocorreria meia década depois, em 1973. 

A Pedra Redonda foi o principal point de descanso às margens do rio Guaíba. Mas, a partir dos anos 40, a Vila Assunção ganhou um projeto de urbanização pensado para se tornar uma cidade-praia e tornou-se um local badalado para o verão.

Foto publicada no Correio do Povo em 4 de janeiro de 1966 ilustrando uma matéria sobre falta de limpeza nas praias do Guaíba | Crédito: CP Memória

Entre idas e vindas, André Huyer viveu grande parte dos seus 62 anos na Vila Assunção, território quase pórtico da zona Sul de Porto Alegre. “Quando o trenzinho começou a levar passageiros em 1900, o principal destino era o bairro Tristeza. Só que lá não tinha praia. Então o trajeto foi estendido até a Pedra Redonda. Ali foi o principal ponto de veraneio no começo do século 20. Depois começaram os loteamentos”, conta o arquiteto e urbanista.

Um desses loteamentos, o último a ser urbanizado, virou o que hoje conhecemos como a Vila Assunção, inaugurada em 1941. Nesta época, o auge da prática de veraneio já tinha passado, mas a zona Sul ainda seguia sendo destino para o ‘descanso’ dos porto-alegrenses entre dezembro e março. O lugar onde os banhistas se refrescavam do calor é hoje onde fica o clube Jangadeiros, lembra André.

O cenário de ‘praia’ naquele ponto ficou nos cartões postais, na memória e nas fotos tiradas há 50 anos. O sumiço da faixa de areia ali pode ser atribuída a alguns fatores, segundo o arquiteto: crescimento da vegetação que a ocultou, uma interferência na correnteza da água ou até mesmo consequência da urbanização.

O fato é que ali cadeiras e esteiras eram postas como em qualquer cena de veraneio. O público do chamado “Balneário Aristocrático” era formado por pessoas da classe média e alta de Porto Alegre. Algumas delas moravam na região, mas também era comum que famílias se deslocassem e alugassem casas para a temporada.

 Foto publicada em uma coluna do Correio do Povo em 7 de janeiro de 1966 com texto que traz reclamações de banhistas pela ausência de vestiário na praia da Vila Assunção. Medida era prevista no Código de Posturas do Município | Crédito: CP Memória

Quando adolescente, André frequentava a praia - que era como uma extensão de sua casa. “Eu chegava lá com os amigos, tomava um banho e depois ia embora. Mas era normal que pessoas levassem cadeiras e ficassem mais tempo na areia”, lembra ele ao destacar que alguns balneários tinham até cabines na beira-mar para os banhistas trocarem de roupa.

Já com a ferrovia desativada, a mobilidade era feita com carro – pela avenida que foi aberta em 1919 ao lado da margem do Guaíba – e pelas linhas de ônibus que iniciaram o trajeto em 1929.

A procura do bairro para o veraneio durou até o início da década de 70. Dois fatores colocaram fim a esta era: o fácil acesso ao Litoral Norte e outros balneários e a poluição das águas do rio Guaíba.

Atualmente, duas praias seguem próprias para banho em Porto Alegre, conforme o boletim de balneabilidade divulgado no último verão pelo governo do Estado. São eles: postos 1, 2 e 3 de Belém Novo e 1, 2 e 3 do Lami, todos na zona Sul da cidade.

Um projeto de bairro com uma praia

O projeto de urbanização da Vila Assunção, feito pelo engenheiro Ruy Viveiros Leiria, foi aprovado pela Prefeitura de Porto Alegre em 7 de abril de 1938. Para privilegiar a orla, que era acesso à praia, ele previu a construção de uma escadaria e muros de arrimo (estruturas de contenção para estabilizar encostas).

“Ao contrário de outros balneários da zona Sul de Porto Alegre, tratava-se muito mais do que um loteamento residencial”, registrou o arquiteto André Huyer em um artigo sobre o bairro publicado no livro “Viva o Centro A Pé” (2014).

Por conta da construção de uma avenida que contorna todo o rio – que hoje conhecemos como a avenida Guaíba –, as casas não tinham acesso privado à praia. Ele era feito pela escadaria construída e por pequenos acessos construídos entre os lotes.

Para mostrar aos possíveis compradores o potencial do projeto pensado para o bairro, uma casa-modelo foi criada. No anúncio publicitário de 1940, a imobiliária destacava: “Villa Assumpção - O balneário aristocrático”, acompanhado de “a mais perfeita obra urbanística do gênero executada no sul do país”.

Fonte: Revista de Engenharia do Rio Grande do Sul, nº 2, setembro de 1945

O bairro também contava na época com outro diferencial, hoje camuflado em meio às construções descaracterizadas e outras mais modernas. Se tratava do estilo californiano da arquitetura. Quem transita pelas ruas ainda consegue perceber algumas residências com a estética preservada. Uma dessas casas é a de Clea Joelice Passuello Sandri, que fica em frente à praça Araguaia e a poucos metros da escadaria que levava à praia – e hoje acaba na água.

O imóvel de paredes brancas texturizadas e uma varanda com aberturas em arcos alongados, tanto na frente quanto nas laterais, foi construído em 1940, data que consta na escritura segundo a proprietária. “Eu amo a estética desta casa, acho lindíssima. A única coisa que alterei foi a colocação de vidros para fechar as aberturas da varanda, por conta do frio que vem do Guaíba”, fala percorrendo os olhos por cada detalhe do espaço preenchido por quadros com fotografias da família e decoração retrô.

Foto: Mauro Schaefer

Clea lembra que na época morava ali uma pianista famosa de Porto Alegre, a Maria Mottola. Porém, a farmacêutica de 76 anos, agora aposentada, só foi se tornar dona e moradora da charmosa casa em 1986. Ela lamenta não ter vivido a época de veraneio. Mas é direta ao afirmar que o que mais ama ali é o silêncio e a tranquilidade.

Da varanda da casa dela, com vista livre para o rio, é possível ver a calçada, a orla e o muro como uma espécie de mirante. E depois só água e uma placa que alerta: águas impróprias para o banho.

Foto: Mauro Schaefer


Correio do Povo

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