Toffoli, o PT e a Lava Jato!

Artigo de Edison Vicentini Barroso, desembargador do TJ-SP. O autor assina o texto como “magistrado (de carreira) e cidadão brasileiro”.
Dados biográficos. Dias Toffoli, 47 anos, ex-advogado do PT (em três campanhas presidenciais de Lula), levado à subchefia de Assuntos Jurídicos da Casa Civil da Presidência da República, então comandada por José Dirceu, chegou à Advocacia-Geral da União em 2007, a convite de Lula – seu ‘padrinho’ – e por este indicado ao Supremo Tribunal Federal (STF) em 2009. É o atual presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE).
Ou seja, um homem de indiscutível digital petista, tornado juiz pelas mãos do representante maior do PT, com cuja história se confunde. Hoje, integrante da 1ª Turma do STF, está a migrar para a 2ª Turma, competente à análise de possíveis futuras ações penais relativas à Operação Lava Jato no âmbito do Tribunal.
Não se discute da possibilidade regimental da medida, para suprir vaga deixada por Joaquim Barbosa e diante da omissão de Dilma Rousseff na nomeação de seu substituto, com vista a evitar empate nos julgamentos (a sempre beneficiar os réus) – já que a 2ª Turma está composta por quatro ministros, número par.
Todavia, nem sempre o que é legal/regimental é oportuno e moralmente aceitável. Até pelas preexistentes intervenções de Toffoli nas coisas afetas às questões político/eleitorais, a pender para o lado do PT, haver-se-ia de dar por impedido de participar de julgamentos afetos a políticos atrelados a Partido e aliados vinculados a governo de sua percebida predileção.
Como homem, que também o é, o ministro não está isento de influências, inda que inconscientemente, suscetíveis de repercutir no seu juízo de valor,levando à eventual dúvida justificável quanto da imparcialidade de sua atuação naqueles julgamentos específicos. Mais que isto, pela dinâmica do STF, com a breve cessação da presidência de Teori Zavascki frente àquela 2ª Turma, Toffoli passará a ser o presidente, encarregado de coordenar seus julgamentos.
No mínimo estranha a conduta de Toffoli, pelos antigos aparentes laços com o PT e seus integrantes, aos quais as decisões muito interessam, ligação que, inda hoje, também aparentemente, persiste. No meio jurídico, sabe-se da total conveniência de que um magistrado, nas condições aqui enfocadas, procure não participar de julgamentos que possam pôr em xeque sua atuação. Isso decorre, até, de regras de experiência comum subministradas pela observação do que ordinariamente acontece.
Seria natural, pois, não procurasse ele a dita migração de Turma, por aspecto contextual visceralmente ligado a seu passado recente. É pôr lenha na fogueira, dar munição à crítica oportuna e eventualmente fundada. E o faz, veja-se bem, na véspera de reunião de última hora agendada com a presidente da República, a durar cerca duma hora e meia.
A opção, associada a esse encontro – que, na aparência, de casual nada tem –, fala desfavoravelmente ao ministro, pelas ligações de sempre com o Partido no Poder, a dar pano pra manga. De fato, o encontro pode ter sido fruto de coincidência – ou não. Mas, uma coisa é inegável: qual acontecido, circunstancialmente, dá no que pensar.
Aqui, não se está a levantar teoria conspiratória, tão-só a refletir e ponderar sobre atitudes razoáveis ou não, recomendáveis ou não – por situações que hoje permeiam a vida nacional. Fica a observação, assim, do inusitado do acontecimento, a fugir do padrão comum do que normalmente sucede.
E isso permanecerá, enquanto não se criem mecanismos novos e justos de nomeação de ministros dos tribunais ditos superiores, baseados não na indicação política de um presidente da República, mas no mérito real daqueles que se candidatem ao cargo.
Fonte: Espaço Vital - www.espacovital.com.br - 13/03/2015 e Endividado

 

Conar determina que Petrobras altere comercial sobre superação

por AGUIRRE TALENTO e MÁRCIO FALCÃO

O Conar (Conselho Nacional de Autorregulamentação Publicitária) determinou que a Petrobras altere o comercial criado pela empresa sob o mote de superação que tenta reverter os danos de imagem causados pelo escândalo de corrupção.
A decisão foi tomada pelo Conselho de Ética nesta quinta (12), atendendo uma representação feita pelo deputado José Carlos Aleluia (DEM-BA).
A maioria dos conselheiros acolheu argumento do congressista de que a peça publicitária pode provocar uma confusão ao mencionar fatos históricos com os desafios que surgiram a partir das denúncias de desvios na estatal.

Reprodução

Propaganda da Petrobras

Propaganda da Petrobras "ontem, hoje e sempre superando desafios"

Para o conselho, a empresa não deve colocar no mesmo patamar desafios históricos e os atuais para vencer a crise. Ainda cabe recurso da deliberação do Conar, mas a Petrobras precisa executar as mudanças imediatamente.
Numa tentativa de reverter o desgaste pelas denúncias de corrupção, a Petrobras lançou em fevereiro uma ofensiva publicitária em tom épico. Com o lema da superação, a campanha tenta colocar a onda de más notícias reveladas pela Operação Lava Jato como mais um obstáculo na trajetória de 61 anos e que, assim como nos primórdios, quando as pessoas não acreditavam que havia petróleo no Brasil, a empresa vencerá mais essa etapa.
"Hoje os desafios são outros e por isso estamos aprimorando a governança e a conformidade na gestão. Seja qual for o desafio, nossa resposta será aquela que nos acompanha desde sempre. Superação", diz a empresa na propaganda
Segundo Aleluia, a propaganda era "mentirosa". "É criminoso fazer uma propaganda dessa, que em nada condiz com a verdade, ainda mais diante de um escândalo desses. É jogar dinheiro público fora", afirmou.
Por meio de sua assessoria, a Petrobras informou que aguarda a comunicação do Conar, definindo as características da alteração determinada, para avaliar o que será realizado.
Fonte: Folha Online - 13/03/2015 e Endividado

 

 

PREÇOS E CÂMBIO: MINISTRO LEVY ADOTA “POLÍTICAS”  DE ALTO RISCO!


1. Tanto a dinâmica política quanto a dinâmica econômica têm altas taxas de imprevisibilidade quando seus indicadores flutuam fora das margens de segurança. Quando estes indicadores mostram um movimento sustentável, caracterizam uma tendência. Isso vale tanto para tendências positivas como negativas.
2. Fica cada dia mais claro que o avanço da inflação e o crescimento do câmbio são a parte fulcral da política econômica de curto prazo do ministro Joaquim Levy. A inflação crescente cumpre duas funções favoráveis à política econômica do governo.
3. Primeiro porque corrige os preços relativos, reprimidos nos últimos anos como arma política (a popularidade dos presidentes) e como arma econômica ('controle' do índice de preços). Segundo porque funciona como tributação disfarçada, aumentando as receitas tributárias do governo e reduzindo as despesas reais não financeiras do governo (como os salários e os contratos nominais dos governos).
4. A disparada do dólar em relação ao real, da mesma forma, cumpre funções favoráveis ao governo. Valoriza em reais as reservas em dólar. Ajuda a corrigir os problemas da balança corrente, seja pela maior competitividade das exportações, pela substituição de importações, como por menor pressão nos serviços (turismo...). Produz também distorções previsíveis como aumento da inflação (favorável) e o aumento do custo do serviço das dívidas públicas e privadas em dólar (desfavorável pelos riscos de inadimplência).
5. Enquanto se debate as medidas fiscais e previdenciárias anunciadas pelo ministro Levy, que certamente são parte integrante de sua política fiscal, aquilo que é mais significativo na política econômica não explícita dele flutua fora do parlamento, ao sabor do riso quase irônico do ministro nas reuniões que participa, conforme as fotos publicadas.
6. Essa política econômica –digamos- outsider em relação à inflação e ao câmbio desliza tranquilamente. Mas incorpora um enorme risco, pois afeta a expectativa das pessoas e das empresas, que sentem seus efeitos e reagem sem levar em conta o raciocínio sofisticado do papel que cumprem em curto prazo.
7. Analistas dizem que o câmbio cresce pela insegurança que têm as pessoas e empresas nessa conjuntura de crise política e econômica. Ou seja, o crescimento do câmbio seria efeito disso. Essa é uma análise equivocada como ponto de partida. O câmbio cresce induzido pelo próprio governo. Mas não o é como derivada segunda, como segundo momento.
8. Num quadro de crises, econômica e política, as curvas ascendentes da inflação e do câmbio –induzidas pelo governo- são percebidas pelas pessoas como descontrole e agravamento dessas crises. E –sendo assim- elas tomam decisões defensivas que só fazem agravar a crise.
9. Bem que o ministro às vezes inclui em suas falas alguns ruídos que permitem entender assim, especialmente os relacionados aos preços reprimidos e a perda de competitividade das exportações. Mas isso não permite que as pessoas percebam e concluam que inflação e câmbio –crescendo- são ajustes feitos pelo próprio.
10. Um risco muito grande. A perda de controle percebida erradamente pode se transformar em perda de controle efetiva, saindo das rédeas do ministro.

Ex-Blog do Cesar Maia

 

Dólar em espécie chega a custar R$ 3,48 em casas de câmbio de São Paulo

por THAIS FASCINA e DANIELLE BRANT

Nesta sexta-feira (13), o dólar bateu R$ 3,28 , tanto considerando o preço da moeda americana à vista, usada como referência para negociações no mercado financeiro, quanto de comercial, utilizada no comércio exterior.
Em sete casas de câmbio da cidade de São Paulo consultadas pela Folha, no entanto, o valor pago pelo turista é maior (veja preços em tabela abaixo).
As instituições financeiras têm a prerrogativa de atribuir o valor que desejarem à moeda, que é um produto como qualquer outro. Por isso, é importante pesquisar e comparar preços antes de comprar.
O dólar turismo em espécie, por volta das 13h30, variava entre R$ 3,36 e R$ 3,48. No cartão pré-pago, o preço ia de R$ 3,55 a R$ 3,66. Os valores já consideram imposto –IOF (Imposto Sobre Operações Financeiras) de 0,38% para compra de dinheiro vivo e de 6,38% no cartão– e não incluem taxas de serviços, cobradas por algumas empresas.
Assim, o cliente que precisar comprar US$ 1.000 em espécie, por exemplo, terá de desembolsar até R$ 3.480. Já no cartão pré-pago, até R$ 3.660.
Porém, vale lembrar que a aquisição do cartão pré-pago pode custar até R$ 12. Algumas casas de câmbio não cobram nenhum valor, mas exigem uma quantia mínima de crédito, que pode variar entre US$ 100 e US$ 200.
PREÇOS DO DÓLAR EM CASAS DE CÂMBIO DE SP

CAUSA E EFEITO
Para Luciano Rostagno, estrategista-chefe do Banco Mizuho do Brasil, o principal motivo para a desvalorização do real é a crise política que pode "prolongar a crise econômica".
"Os protestos do próximo domingo podem abalar ainda mais a popularidade da presidente Dilma Rousseff e dificultar a implementação das medidas de ajuste fiscal necessárias para colocar as contas do governo em uma trajetória sustentável e, assim, evitar o rebaixamento da nota de crédito brasileira pelas agências de classificação de risco", diz Rostagno.
Mas não são só as tensões domésticas que impulsionam o dólar ante o real. O cenário externo também contribui para a forte valorização da moeda americana. Das 24 principais moedas de países emergentes, 21 se desvalorizam em relação ao dólar nesta manhã.
Na semana que vem ocorre a reunião do Federal Reserve (Fed, banco central americano) e analistas esperam que a autoridade monetária retire de seu comunicado a palavra "paciente" ao se referir a um possível aumento da taxa de juros nos Estados Unidos.
Uma elevação dos juros deixa os títulos americanos -considerados de baixo risco e cuja remuneração acompanha a oscilação da taxa- mais atraentes aos investidores internacionais, que preferem aplicar seus dólares lá a levar os recursos para países de maior risco -como emergentes, incluindo o Brasil.
Diante da perspectiva de entrada menor de dólares no Brasil, o preço da moeda americana sobe em relação ao real.
Fonte: Folha Online - 13/03/2015 e Endividado

 

 

País passa por ′desotimismo′, e criatividade vive crise, diz Olivetto

por SILVIO CIOFFI

Entusiasmado por natureza e um dos mais populares publicitários brasileiros, Washington Olivetto, 63, se diz preocupado com o "desotimismo que estamos vivendo" e, também, "com as investigações".
Criador de campanhas antológicas para a Cofap, Brastemp, Bombril, Itaú e Valisère, entre outras, Olivetto, que nunca fez trabalhos de marketing político e nem publicidade para empresas públicas, diz ainda que "quando o anunciante governo encolhe, a propaganda brasileira também encolhe".
Presidente da agência W/McCann e ganhador de 50 Leões de Ouro em Cannes (França), ele trabalha como "homem de criação" desde os 18 anos e, recentemente, se tornou no final de janeiro o primeiro não-anglo saxão a entrar para o Hall of Fame (hall da fama) do The One Club Creative, concedido há 54 anos, no Gotham Hall, em Nova York.
Leia a seguir os trechos de sua entrevista exclusiva concedida à Folha.
CRISE À BRASILEIRA
Acho que a sociedade brasileira quer manter a estabilidade, mas parece que há uma certa "fadiga de material" no discurso do governo. No discurso atual, a diferença entre a versão e o fato ficou clara depois da eleição.
É aterrorizante que coisas importantes para as pessoas que nasceram depois dos anos 1950, como a não inflação, possam estar em jogo. De todo modo, a sociedade brasileira tem capacidade de reinvindicar e de exigir estabilidade e normalidade, mesmo nesse momento difícil.
De antemão, daria para dizer que fosse qual fosse o resultado da eleição, pela circunstância que o Brasil já vivia naquele momento, certamente as medidas tomadas depois por quem ganhasse seriam muito similares.
O que possivelmente seria diferente é o astral com que essas medidas estão sendo recebidas. Tivemos uma disputa eleitoral violenta e, em empresas e em países, a administração do astral é tão importante quanto a administração do caixa.
Mas vamos falar da publicidade hoje: do ponto de vista criativo e estético, não vive um momento brilhante, a situação do Brasil também não vive um momento brilhante –e estamos todos preocupados.
Em momentos de crise, tanto a publicidade sofre, como as empresas podem anunciar mais. Muitas vezes digo aos clientes: se você me perguntar se num momento de crise a publicidade vai ajudar a vender mais, eu respondo que não necessariamente.
Mas, se a pergunta for, se é oportuno fazer esse trabalho, eu vou dizer que certamente sim, porque nesse momento você pode lavrar uma imagem maior do que seus concorrentes e ficar mais preparado no momento em que tudo melhorar.
Aliás, o profissional de publicidade no Brasil é um dos mais aparelhados para trabalhar em crise. Na minha carreira, foram raros os momentos que não trabalhamos em meio a crises.
CAMPANHAS POLÍTICAS
Nunca fiz marketing político. Dediquei toda a minha vida à iniciativa privada, foi uma opção. A sequência disso foi assim: quando comecei, não queria fazer porque no Brasil tinha ditadura política.
Tinha a sorte de ser empregado pelos DPZ [agência dos publicitários Roberto Duailibi, Francesc Petit e José Zaragoza], que não me obrigaram e nem pediram para fazer.
Não sei como seria se, aos 20 anos, eu trabalhasse numa agência que dissesse que eu tinha que fazer.
A DPZ praticamente não fazia, mas lá eu fiquei como o cara que não fazia nem campanhas políticas e nem de empresas governamentais.
E continuei não fazendo e essa relação, que começou intuitiva, fez com que eu determinado momento eu percebesse que essa postura era cômoda ideologicamente e, ao mesmo tempo, se transformava num diferencial meu.
A Petrobras, para minha geração era uma referência, mas eu nunca fiz. E, quando apareceu a oportunidade de fazer campanha para os Correios, por coerência, também não fiz, mas até gostaria de ter feito...
Quando fiz a fusão da W/Brasil com a McCann, coloquei isso na minha declaração de princípios.
COMEÇO NA PROFISSÃO
Foi curioso, até contei agora, no dia do prêmio Hall of Fame, como eu comecei a trabalhar numa agência de publicidade. No início do meu discurso lá em Nova York, disse que queria deixar claro que só estava lá porque meu pneu furou.
Então eu tinha 18 ou 19 anos, e, antes disso, já na adolescência, havia descoberto para o que eu serviria na vida. Como aprendi a ler muito cedo, digo que devo minha vida ao Monteiro Lobato –eu até preferiria dizer que devo ao F. Scott Fitzgerald, mas não... E aos 13 anos, já sabia que queria viver de escrever.
Por outro lado, meu pai era um vendedor, representante da fábrica de pincéis Tigre, de pelo de marta, uma espécie de vison dos pincéis.
Ele era um vendedor daqueles exuberantes. Aliás, os grandes vendedores não vendem, eles criam confiança. Fazem na verdade o que faz um publicitário: criar predisposição de compra e não apenas vender.
Na infância e na adolescência, me habituei a sair do colégio e eventualmente íamos juntos a depósitos de material de construção. E chegando lá, os clientes dele diziam para ele ver o que estava faltando e mandar.
E eu ficava fascinado com essa relação da confiabilidade. Isso, no meu trabalho, tem relação com a busca pelo coloquial. Publicidade, para mim, era uma mistura de querer escrever e querer vender.
Nessa época, fui encantadoramente atropelado pelo momento de profissionalização da propaganda brasileira: nada teria acontecido comigo se não fosse a geração anterior de publicitários, caso do Alex Periscinoto, indubitavelmente dos DPZ, do Mauro Salles, do encantador Neil Ferreira e com o respeito pela publicidade deles, que tinha menos brilho criativo, caso da Norton.
E assisti a uma palestra do Neil quando eu tinha 18 anos –e ele devia ter 25. Eu queria ser ele e, anos depois, tive o prazer de contratá-lo.
PNEU FURADO E CARREIRA
Meu pai era um homem de classe média, que trabalhava muito, mas, quando entrei na faculdade, ele me deu um carro. E eu tinha uma tia, irmã do meu pai, que não tinha filhos e que era uma mulher sofisticada, que me ensinou a tomar chá na Vienense, cortar cabelo no Mappin, todas essas frescuras.
O marido dela, que me ensinou a ser corintiano, tinha uma Karmann-Ghia vermelho. Mas minha tia não gostava dele andando nesse carro e trocou meu Fusca pelo carro dele. E, graças ao ciúme dela, eu ia para a faculdade no Karmann-Ghia, o que era uma relação desproporcional para um menino como eu, de classe média muito média.
Um dia, o pneu desse carro vermelho furou na rua Itambé, onde tem o MacKenzie.
Como não sei fazer algumas coisas que envolvem habilidade manual, como cortar unhas, trocar pneus era uma coisa traumática. Meu pai tinha critérios exacerbados de masculinidade, queria sempre que eu o ajudasse arrumar o carro.
Mas eu não queria trocar pneu e, quando isso aconteceu, eu estava de jardineira, de cabelo comprido, e nesse momento eu vi o escritório da HGP Publicidade e pensei: vou pedir um estágio.
Nesse momento começava a aparecer a palavra mídia. E a propaganda tinha grandes textos, já vendia muito bem até carros como o Simca Chambord, que era superbacana, mas ficou apelidado de "O Belo Antonio", que era um personagem do Marcello Mastroniani que era lindo, mas não funcionava muito bem.
Para resumir, entrei na agência e disse que queria falar com o dono. O dono, que se chamava Juvenal Azevedo, que faleceu recentemente, apareceu e eu disse que ele deveria estar no dia de sorte, porque eu queria trabalhar lá e podia ser muito bom nisso. E disse ainda que meu pneu não costumava furar duas vezes no mesmo lugar.
Era uma agência muito pequena e ele, que era muito legal, me contratou um mês depois.
No terceiro mês ele me chamou e disse que eu tinha potencial e sugeriu que nos finais de tarde eu fosse mostrar meu trabalho nas agências mais importantes.
Aí, é claro, eu não fui mais em faculdade nenhuma. E sou obsessivo e comecei trabalhar com muito prazer e muita alegria, com o Juvenal me ensinando. A geração de publicitários dele era uma geração de uma generosidade muito grande, que formou um caminhão de pessoas, como também acontecia com os jornalistas daquela época.
Assim, graças ao Juvenal Azevedo, no final da tarde eu mostrava meus trabalhos para pessoas como Hercílio Tranjan –com ele, eu brincava dizendo que Hercílio foi a minha primeira agência de propaganda.
LINHA DE TRABALHO
Estou com 63 e estou desde os 18 anos nessa história. Participei de vários momentos de empresas e de marcas. E sempre queria que repetissem as coisas que eu criava, é onde me movimento melhor, minha obsessão.
Nessa atividade repleta de dúvidas, é preciso ter ousadia, ter coragem e o profissional honesto quer entrar para a cultura popular.
Tem campanha que é boa, mas não vende. Tem campanha que não é boa e vende. Mas as boas mesmo são as que são boas e que vendem.
Acho que a publicidade no Brasil se situa, na média, entre as três maiores do mundo, depois da inglesa e da americana. Quando eu digo média é porque, na maioria das vezes, a qualidade da propaganda em todos os países é muito ruim. E da média em geral, os ingleses têm média um pouco melhor do que a gente.
De uma certa maneira, antes mesmo de exisitir as redes sociais, eu queria que repetissem nas ruas as minhas campanhas. Eu não tinha isso racionalizado, mas eu sabia que esse seria meu caminho, minha obsessão foi, sempre, fazer a ligação disso com a cultura popular.
Devo muito da visibilidade pessoal à geração que criou no Brasil a TV aberta, mas faço tudo com o maior prazer: propaganda para jornal, para revista etc. O profissional tem que ter o prazer, o tesão, a humildade e a pretensão de fazer tão bem feito desde o comercial de TV até o folheto que distribui no pedágio. Esse é o desafio do profissional de propaganda.
Anúncios de oportunidade em jornal, nos anos 1970, foram trabalhos que eu fiz com enorme prazer. O anúncio de jornal tem que ter a cara e a instantaneidade do jornal.
O primeiro que eu fiz, com genial Francesc Petit, para o Banco Itaú, que na época uma máquina de tirar dinheiro pioneira que se chamava Itaú-cheque.
Na Semana Santa, quando o banco estava fechado, fiz um anúncio assim: o Itaú aproveita a Semana Santa para vender o seu peixe. Isso é um anúncio de jornal. É como você pegar o dia primeiro de abril e dizer que não é mentira, que você é o homem mais bonito do mundo! A mídia jornal permanecerá para sempre.
E também a do rádio, Nossa Senhora!, para um criador de publicitário, o rádio joga com a imaginação e não existe cenário mais maravilhoso que a imaginação.
Ciclicamente, acontece que toda a vez que aparecem novas mídias, as pessoas dizem que as velhas vão morrer.
Muitas pessoas são lineares, primárias. O rádio não morreu com a TV, os jornais estão muito vivos.
Somos um dos maiores países analógicos do planeta, graças particularmente à competência da Rede Globo, e somos um dos maiores países digitais também. Mas também somos um país onde há regiões sem luz elétrica; ano passado fizemos um comercial numa cidade do Piauí chamada Betânia. Lá, as crianças nunca tinham visto o Natal iluminado.
REFERÊNCIAS CULTURAIS
Amo um "caminhão" de profissionais da publicidade brasileira, mas meus grandes gurus são o Boni [José Bonifácio de Oliveira Sobrinho, que trabalhou na Rede Globo] e o André Midani. Aliás está estreando um documentário sobre o André Midani, um cara que descobriu a Bossa Nova, o Tropicalismo e o rock′n′roll por aqui.
Nesse momento, no começo, meu trabalho tinha uma relação íntima com o pop, com a cultura popular. Mas eu não tinha ainda uma organização mental para só querer isso o tempo todo.
Quando comecei a ter um salário de redator de publicidade, fui virando um avião consertado em pleno voo. Sou um caso raro de poliglota analfabeto, falo perfeitamente mal várias línguas e faço palestra em todas elas.
Adoro arquitetura, e para mim Le Corbusier era um troço. Mas não se imaginava que ele era um "se-achão", ele não chamava assim, mas se pôs um nome [Charles-Edouard Jeanneret-Gris (1887-1965), arquiteto franco-suíço, um dos mestres de Oscar Niemeyer (1907-2012].
E eu tenho um desenho do Corcovado feito por Oscar Niemeyer, que foi feito para um evento com o Tom Jobim entre os anos 2000 e 2001. Parece que "o arquiteto" disse, ao fazer, que só mesmo o Tom Jobim para fazê-lo desenhar um Cristo.
No final deste ano eu desapareci [com voz grave, lembra o período em que foi sequestrado por 53 dias em 2002], eu dei uma sumida por bastante tempo...
Quando eu "voltei", dois dias depois, como mencionei que havia adorado o desenho, ganhei esse desenho com dedicatória do Dr. Oscar!
Sabe quem tem desenhos dele também, o Domenico De Masi [sociólogo contemporâneo italiano, autor do conceito de ócio criativo], que eu conheci em Ravello, onde fui fazer palestra e onde o Niemeyer projetou um teatro.
E lá tomei negroni com Gore Vidal [nome de pluma de Eugene Louis Vidal (1925-2012), escritor americano que viveu na Itália].
GRANDE PRÊMIO
O lugar onde a premiação acontece do Hall of Fame, o Gotham Hall, em Nova York, é realmente emocionante, construído entre 1922 e 1924.
E a cerimônia mantém a coisa ritual, é uma festa black-tie e reúne 300 convidados, uma boa parte deles ganhadores desse prêmio.
O primeiro prêmio, concedido a Leo Burnett, aconteceu em 1961, que não é um dos meus publicitários preferidos. Depois teve o David Ogilvy. Como o Hall Fame é dado a grandes figuras da propaganda e também do desgin, mais recentemente o Steve Jobs ganhou esse prêmio.
E foi legal eu ter ganho isso vivo e ativo, porque há muitos que receberam o título post-mortem ou aposentados.
Fonte: Folha Online - 14/03/2015 e Endividado

Nenhum comentário:

Postar um comentário