
Na noite de 24 para 25 de fevereiro de 1956, na sala do Soviete Supremo do Kremlin, durante uma sessão secreta do XX Congresso do Partido Comunista da URSS, em que há delegados estrangeiros, Nikita Kruschev lê o famoso relatório em que denuncia o “culto da personalidade” e os erros de Stalin. Erros será uma palavra fraca: trata-se de verdadeiros crimes, na opinião do Sr. Nikita Kruschev.
O relatório é secreto, mas, pouco a pouco, seu texto explosivo vai chegando às mãos de Mao Tsé-tung. E quando Mikoyan vem para Pequim, em abril, o presidente da China Popular pede explicações e indigna-se por não terem sido consultados os “partidos irmão” antes de uma modificação da “linha” como tal amplitude. Embora aprovando “algumas” teses políticas do XX Congresso, Mao ataca abertamente os processos arrogantes do Kremlin, o “chauvinismo de grande potência” de que a Rússia parece dar provas, o desprezo que mostra seus aliados mais próximos.
Mikoyan tenta apaziguar seu interlocutor, mas a verdade é que está descoberto o pretexto para uma separação de pessoas e bens entre Moscou e Pequim. Mao, em público, continua tecendo louvores à União Soviética e aos seus dirigentes, mas por trás da cortina, vai apoiando todos os que, no clã comunista, têm razões de queixa de Kruschev: tanto os “stalinistas” como os “revisionistas”, que querem tirar as consequências mais extremas da “destalinização”, especialmente, na Polônia e na Hungria.
É na Polônia que os redemoinhos provocados pelo relatório de Kruschev primeiro atingem a superfície. Em junho de 1956, estoura um levante de operários na cidade de Poznan. O governo de Varsóvia, no receio de uma insurreição geral, quer eliminar do partido os “stalinistas” e restituir o lugar de primeiro-ministro a Gomulka, que esteve na prisão quatro anos nos tempos de Stalin, depois de ter sido demitido por sua ordem. O Primeiro-secretário nessa época, Ochab, está de acordo. Mas Kruschev, que considera Gomulka um anti-soviético, opõe seu veto. A Polônia entra em efervescência. Ochab vai em setembro representar o partido polonês no VIII Congresso do Partido Comunista Chinês. Em Pequim, Mao Tsé-tung aprova solenemente, na presença de Mikoyan, a nomeação de Gomulka e – para dar aos “revisionistas” polacos o aval chinês – manda para Varsóvia seu fiel (então ainda era fiel) Liu Chao-Chi. É convocada a Comissão Central polonesa: Gomulka profere um libelo impiedoso contra o “imperialismo” de Stalin. As forças militares russas cercam Varsóvia. Kruschev, rodeado por Molotov, Bulgarine e Mikoyan, bem como por um grupo de marechais russos, desembarca por sua vez em Varsóvia e exige que Gomulka seja afastado do Poder. As tropas polonesas começam a convergir sobre as forças russas que cercam a capital, a população de Varsóvia manifesta-se nas ruas, apoiando Gomulka. A situação é explosiva. Então é que Chu En-lai oferece a Gomulka e seus amigos refúgio, na embaixada da China, e volta a Moscou com Kruschev, para informar solenemente ao Kremlin de que Mao Tsé-tung não tolerará o emprego de força contra os “camaradas poloneses”.
A 23 de outubro, Kruschev cede: as forças russas na Polônia recebem ordens para regressarem a suas bases. Já nada impede que Gomulka seja primeiro-secretário do Partido Comunista Polonês. Pela primeira vez, Mao assumiu o papel de árbitro supremo do campo comunista, diante de quem até os russos devem inclinar-se. Os acontecimentos, porém, precipitam-se. No próximo dia 23 de outubro de 1956, há centros em Budapeste, entre tropas russas e a população da capital húngara, que está enfurecida por ter sido nomeado primeiro-secretário um tal Geroe, que foi acólito do sargento Rakosi. As notícias do que se deu em Varsóvia eletrizam os húngaros, que querem no poder Nagy – como Gomulka, demitido e preso pelos stalinistas. Também neste caso, por acordo com Mao Tsé-tung, que aproveita como exemplo o regresso da calma na Polônia e a manutenção daquele país na coligação comunista, os russos tornam a ceder. Mas, sem dúvida arrastado pela vaga da revolta anti-soviética, Nagy anuncia que a Hungria abandona o Pacto de Varsóvia.
No Kremlin há um momento de loucura. Que fazer? Kruschev procura o conselho de Mao. E chega a opinião de Pequim: desta vez, está em jogo a integridade do campo comunista. Já não se trata de intervir nos assuntos internos de um partido irmão, mas de manter assuntos internos de um partido irmão, mas de manter a Hungria no movimento comunista, se necessário pela força. É necessária uma intervenção cirúrgica! O resultado é conhecido. O levante húngaro é impiedosamente esmagado pelos tanques russos. O governo Nagy é capturado. Seu adjunto, Kadar, tomar o poder, apoiado pelos russos e pelos chineses. Os ocidentais, desprevenidos e empenhados no caso do Suez, não chegam a reagir.
Pela segunda vez, no espaço de um mês, foi a Mao Tsé-tung – de acordo com a versão chinesa – quem ditou a solução. No caso polonês, impôs um compromisso; no caso da Hungria, preconizou a violência. Nos dois casos, preservou a unidade do bloco comunista, tomou a decisão que correspondia aos interesses do bloco. Impondo-se a Kruschev, que pareceu ultrapassado pelos acontecimentos, interveio como Stalin teria feito. E daí para o futuro só terá para Kruschev condescendência e desprezo.
O papel desempenhado por Mao nos acontecimentos da Polônia e da Hungria mais aumentou seu prestígio em seu próprio partido. Por isso, já que a crise da Destalinização lhe deu oportunidade de livrar-se de todos os laços de subordinação a Moscou, considera que chegou ao momento de tentar na China uma experiência revolucionária. A Comissão política não consegue unanimidade para seguir alegremente seu chefe no novo golpe de pôquer. Mas nada resite à vontade de Mao. E este, depois dos anos de terror e de coação, acha que chegou a altura de anexar os intelectuais e os quadros aterrorizados, tíbios ou opositores. Quer convencê-los a colocarem toda sua inteligência e todo seu saber ao serviço do poder chinês. Chu En-lai apurara que, dos cem mil “intelectuais superiores” da China, apenas quarenta mil adotavam a linha do partido. Para atrair os sessenta mil que vivem no erro, Mao inventou as “cem flores”.
Há quase um ano que o slogan das “cem flores” começou a ser conhecido. “Que as cem flores desabrochem, que todas as escolas se rivalizem”, dizem os dirigentes chineses. O pensamento deve ser livre e exprimir-se livremente. Do confronto entre as várias opiniões é que ressaltará a verdade. A 27 de fevereiro de 1957, Mao Tsé-tung discursa na conferência suprema do Estado e anuncia um novo “TchengFeng” – ou seja: uma nova campanha de “retificação do estilo de trabalho no seio do Partido e do Estado”. “Há ainda quem pergunte – diz ele – se tendo sido no nosso país aceito o marxismo pela grande maioria, ainda haverá quem o possa criticar. A verdade é que é possível. O marxismo constitui uma verdade científica e não receia a crítica. Pelo contrário, os marxistas adquirirão melhor têmpera, melhor desenvolvimento, reforçarão as suas posições no meio da crítica e das lutas tempestuosas. A luta contra as ideias falsas é como a vacinação; não é só quando a vacina pega que o corpo do homem adquire maior resistência à doença. As plantas criadas nas serras dificilmente podem ter maior vitalidade. A aplicação da orientação de que “as cem flores desabrochem, que todas as escolas se rivalizem” não poderá de forma alguma enfraquecer a posição do marxismo no domínio ideológico, mas, pelo contrário, reforçará esta posição.”
Estas afirmações sensacionais desencadearam uma avalanche de críticas, que rapidamente – e por certo como previa Mao – abrem as comportas a uma enxurrada crescente de descontentamento claramente exposto. Há os que denunciam com violência os métodos dos dirigentes comunistas. Outros discutem mesmo o primado do partido.
A revolta verbal, lançada dos círculos não comunistas, conquista as universidades da província. Há um professor que prega, pura e simplesmente, o assassinato político dos dirigentes locais!
O novo “Tcheng-Feng” de Mao toma proporções de uma verdadeira insurreição intelectual contra o regime, uma insurreição que se estende a todo o país. Há uma sessão dramática na sede do partido na “Cidade Proibida” de Pequim.
Liu Chao-chi, o “fiel companheiro”, arvora o estandarte da revolta. Censura Mao por ter empreendido sem cuidado esta campanha. O chefe, envelhecido, mostra-se impassível. Não reconhece seu erro, mas não se opõe a que a “campanha de retificação” seja por seu turno “retificada”.
E por isso, a 8 de junho, o “Diário do Povo” explica que as críticas apenas devem avisar aos “direitistas, e que quem criticou o Partido deve proceder agora a sua própria autocrítica...”
Às “cem flores” sucede, portanto, a repressão. Mais uma vez, o medo empolga a China Popular. A “brisa ligeira” pretendida por Mao transforma-se em vendaval. Comunistas de nomeada, não comunistas, filo comunistas são obrigados a demitir-se. Os mandatos de quarenta deputados à Assembleia Nacional são cassados. Um milhão e trezentos mil intelectuais ou dirigentes são enviados para os campos, a fim de exercerem trabalhos braçais e “tomarem contato com as realidades do povo”. Mao Tsé-tung cometeu seu primeiro erro tático. E como se tivesse a opinião de que, para apagar esse erro, é necessário acelerar o curso da história, omitir sem etapas, tornar possível o que não é, inventa nova fórmula: o “grande salto em frente”. Durante o ano de 1958, arranca simultaneamente em todas as direções – ou melhor: lança os 600 milhões de chineses numa série de aventuras, algumas grandiosas, outras perigosas e uma quantas ridículas.
As massas são mobilizadas na totalidade e permanente. Os velhos devem amanhar terras e os enfermos tornar-se úteis; cem milhões de chineses levantam com as mãos nuas diques e barragens, abrem canais apenas com pás; outros cinquenta milhões são empenhados na campanha do “ferro popular”, que consiste em cavar por toda a parte buracos circulares para fundir tudo o que seja ferroso, a fim de produzir ferro destinado à indústria; a população é convidada a lutar por todos os meios contra os “quatro flagelos” (rataria, mosquitos, moscas e pardais); há quem se empenhe em luta nas ruas no afã de matar mosquitos; centenas de milhares de cachorros são vítimas da campanha contra as bocas inúteis; à juventude são impostos os “cinco princípios” (difundir as decisões do partido, trabalhar energicamente, constituir forças de choque, velar pelos interesses da coletividade, aliar-se aos elementos das comunas e respeitar os camponeses velhos); os quadros, por sua vez, recebem o sistema dos “dois-cinco” (dois dias para estudos econômicos e políticos e cinco para vigiar as atividades dos que os cercam) e a regra dos “quatro conjuntos” (partilhar a vida das massas no que respeite à alimentação, vida diária, trabalho e conselho); todo mundo é convocado a “andar com as duas pernas” (o que significa equilibrar a agricultura com a indústria, a tradição chinesa com as técnicas modernas), a ser “vermelho perito” (cultivar ao mesmo tempo a formação ideológica e os conhecimentos técnicos), etc., etc.
A esta avalanche de slogans internos corresponde um florescimento impressionante de santos e senhas contra o “imperialismo americano”, o “revisionismo iugoslavo”, o “oportunismo soviético”. A coexistência pacífica, tão cara a Kruschev, converte-se numa imensa traição. A Rússia é acusada, ainda em frases encorbetas, de capitular perante os Estados Unidos e Kruschev, que vem a Pequim em agosto de 1958 para pedir explicações e pregar prudência e moderação, vai partir como chegou, depois de conferenciar com um Mao Tsé-tung altaneiro e glacial. A conquista de Formosa está na ordem do dia e, dada a ameaça de invasão da ilha, a Sétima Esquadra norte-americana toma posições diante da costa chinesa. Moscou inquieta-se por esta ameaça de guerra, mostra uma atitude embaraçada, que é tomada por Pequim como nova covardia. A imprensa chinesa nega aos povos coloniais a menor possibilidade de conseguirem a independência se não recorrerem à insurreição armada e à revolução. Numa palavra: como no mais aceso da guerra da Coreia, a China está mobilizada contra o mundo inteiro, à exceção da Albânia, cujos dirigentes stalinistas agradecem a Mao ter tentado reabilitar Stalin para rebaixar Kruschev, e à exceção, como se compreende, do “Terceiro Mundo”, cuja chefia reivindica cada vez mais. Os técnicos soviéticos abandonam, um após outro, o território chinês. O auxílio russo começa a desaparecer.
Finalmente, quando Kruschev, depois de se ter avistado com Eisenhower em Camp David, volta pela terceira vez a Pequim, em outubro de 1959, para pregar a coexistência pacífica e o término da guerra fria, vai enfrentar de novo a recusa terminante de Mao – que, nesse momento, já não é presidente da República Popular da China. É apenas o chefe do Partido Comunista Chinês. É o sucessor de Mao, Liu Chao-chi, quem falará em nome do estado chinês e ouvirá o supremo argumento do russo:
“Já que não querem aliar-se à coexistência pacífica, retiramos a promessa feita há dois anos de fornecer o necessário para a produção da arma atômica”, diz na essência o Sr. Kruschev.
A resposta de Liu Chao-chi é curta:
“Teremos a bomba atômica em menos de cinco anos”. Ao mesmo tempo furioso e cético, Kruschev parte e pela primeira vez não haverá comunicado conjunto. E, muito impressionado por sua viagem à América, declara:
“Nós, os comunistas da União Soviética, consideramos como mais sagrado dever, como tarefa essencial, esgotar as possibilidades para se pôr termo, de uma vez para sempre, à guerra fria.”
Consumou-se a ruptura com a China de Mao. E em breve a imprensa russa vai acusar os chineses de “diversionismo”, nomeadamente por terem criado as “comunas populares”. Mas estas “Comunas populares” são a pedra fundamental do “grande salto em frente” imaginado e aplicado por Mao, o que lhe permite passar de homem de Estado a técnico de comunismo chinês.
O caso das “comunas populares” pode comparar-se ao do “ferro popular”, embora o fracasso quase imediato dos “altos fornos de aldeia” tenha tido menos importância. Ambas as ideias saíram do cérebro de Mao Tsé-tung. O princípio da comuna popular corresponde ao desejo de coletivização imediata e total dos campos. O pessoal não deve dormir em suas casas, mas em dormitórios, e comer nas cantinas. A “pequena família” deve ser dissociada, em proveito de “grande família socialista”: os homens de um lado, as mulheres de outro, as crianças algures. Todo mundo deve viver nos grandes blocos que permitem mais estrita disciplina no trabalho.
As aldeias vão desaparecer para dar lugar às comunas, cada uma com 10.000 a 50.000 habitantes e centro da existência de várias cooperativas reagrupadas. O individualismo deve ser impiedosamente exposto e desenraizado, suprimindo-se as terras individuais e a propriedade de animais ou de utensílios agrícolas. Tudo será gratuito e cada um receberá “segundo suas necessidades”.
Em princípio, é quase comunismo utópico. E não dá resultado. Os camponeses opõem às comunas populares uma resistência passiva, uma inércia, que se conjugam com as normas erradas de produção exigida às comunas, com a falta de concorrência e com o burocratismo dos quadros para paralisar a experiência. Em dezembro de 1958 é anunciado que Mao Tsé-tung abandona a presidência para se consagrar inteiramente às responsabilidades de chefe do Partido. Liu Chao-chi, que está na oposição há mais de ano e meio, desde o malogro das “cem flores”, sucedem-lhe como chefe de estado. Ao fim de vinte meses de tormento provocado pelo súbito delírio interventivo do seu imperador, a China vermelha volta a ser dirigida por estrategistas que vão canalizar aquelas ideias geniais do amo para as realidades do quotidiano. A campanha do “ferro popular” será pura e simplesmente abandonada e levadas a siderurgia tradicional as energia que consome.
Os quadros vão ser impiedosamente “reeducados”. Cem mil oficiais do Exército, entre os quais setenta e cinco generais, são rebaixados de posto, “para aprenderem a modéstia” e passam a consagra-se aos “cinco grandes bens”: cultivo de terras, estradas de ferro, trabalho braçal, nivelamentos e diques...Quanto às comunas populares, em que está empenhado o prestígio de Mao Tsé-tung e do comunismo chinês, depois de uma tentativa de organização mais racional, menos messiânica, e de outra tentativa de extensão do sistema às comunas urbanas, vão ser praticamente penduradas na panóplia dos símbolos do partido. Os camponeses voltam a ter suas jeiras individuais e podem de novo gozar-lhes os benefícios, graças a um mercado paralelo de gêneros alimentícios. Passa a haver prêmios para os que ultrapassam as médias de produção. O que ficou do sistema imaginado por Mao Tsé-tung é a intensificação das cooperativas e melhor organização da exploração da lavoura. Mas a utópica fórmula de “a cada um segundo suas necessidades” dá lugar ao aguilhão do lucro.
Qual poderá ter sido a verdadeira causa, em 1957, daquele desenfreamento da imaginação de Mao Tsé-tung, até então sempre atento às realidades?
Como se explica que este homem, que mostrara sempre uma viva intuição do que é possível, se tivesse aventurado por caminhos tão irreais e tão perigosos para sua própria posição e para o seu país?
A chave desta precipitação, tão rara nele, encontra-se em Moscou, no mês de novembro de 1957. Nessa altura, depois das grandes cerimônias com que se celebrou o quadragésimo aniversário da revolução bolchevista, reúne-se na capital soviética uma conferência ultra secreta dos partidos comunistas de todo o mundo. Na pauta de trabalhos: exame de consciência à luz do XX Congresso, dos acontecimentos da Polônia, do esmagamento do levante húngaro, das iniciativas tomadas pelo Partido Comunista Chinês, do êxito do lançamento dos dois primeiros “Sputniks” russos, que vieram muito a propósito dourar de novo o brasão do Kremlin, um pouco embaciado por todos outros acontecimentos.
Entre os delegados, a fina-flor do comunismo internacional, encontra-se Mao Tsé-tung. Sim, o imperador da China Vermelha dignou-se abandonar pela segunda vez seu país. Sentindo-se forte com o papel que desempenhou na crise de outubro de 1956 e com o ascendente que exerce sobre numerosos partidos seduzidos por sua campanha das “cem flores”, e convencido de que encontrará em Moscou um areópago digno dele, uma assembleia pronta a reconhecer-lhe de maneira clara o título de herdeiro de Lênin, Mao sente-se, no entanto, numa posição falsa.
A debandada que resultou do novo “Tchang-Feng” e a repressão que se está exercendo na China, na própria altura da conferência, fazem com que, inesperadamente, hesitem homens cujas simpatias lhe pareciam conquistadas, dirigentes que tudo lhe devem, como Gomulka e Kadar. O momento é realmente mal escolhido para apresentar como exemplo o que se passa em Pequim. Por seu lado, Kruschev, o destruidor do ídolo e o demolidor do culto da personalidade, já levantou de novo a cabeça. Joga com três argumentos, que propõe ao comunismo mundial:
é preciso permitir que cada partido escolha seu caminho próprio para o comunismo (neste ponto, Mao só pode estar de acordo):
a União Soviética, que com o lançamento dos “Sputniks” demonstrou sua superioridade sobre o resto do mundo, deve continuar servindo de exemplo e de guia (com isto não está Mao de acordo, apesar de quanto diz em seus discursos);
tendo demonstrado seu poder, a União Soviética propõe-se pôr termo à guerra fria, transferir a prova de força com o mundo capitalista para o terreno da competição econômica, praticar a “coexistência pacífica” (Mao mostra-se resolutamente contra).
A atitude “pura e dura” do senhor da China afasta os que, um mês antes, ainda eram seus mais fiéis aliados. Gomulka e Togliatti, seduzidos pelas perspectivas abertas pela coexistência pacífica, aliam-se a Kruschev. Mao modifica o fogo de suas baterias e apresenta-se como defensor do “centralismo” no movimento comunista, bem como da regra da unanimidade para as decisões importantes – o que equivale dar a cada partido o direito de veto. E logo os países “duros” se lhe juntam, aterrados pelas consequências previsíveis da “desestalinização”, como os asiáticos no caso os indonésios, japoneses, vietnamitas, coreanos. Como habilidade, com perseverança, lutando na mesa da conferência como um touro na arena, Mao Tsé-tung leva Kruschev à parede. Aceita que na resolução final se mencione que a União Soviética é “a cabeça do campo socialista”; mas esclarece o sentido desta fórmula: “Pensamos que estão à cabeça do movimento de forma alguma contradiz o princípio da igualdade entre os partidos irmãos. Esse fato não dará ao partido soviético o direito de dispor dos outros partidos, mas apenas lhe atribui responsabilidade e dever maiores!”
Kruschev, que não é tolo, vê muito bem aonde Mao quer chegar: a China o que quer é levar os russos a fazerem beneficiar todos os outros de suas riquezas e do seu poder, designadamente do seu poder nuclear. E furioso, o Sr. Kruschev declara, em essência:
“Que nos pode proporcionar, concretamente, essa 'cabeça'”? Nem leite, nem manteiga, nem batatas, nem legumes, nem casas! E no plano moral, o que vale? Nada! Então para que serve a tal “cabeça”? Que vá para o diabo!”
Mao, porém, ataca sempre. Desta vez contesta a teoria da coexistência pacífica. Afirma que o campo socialista, em sua opinião, adquiriu tal potência que renunciar à ofensiva permanente e direta contra o imperialismo equivale a atraiçoar a ideologia marxista-leninista e os povos que vivem sob o jugo capitalista.
“A característica do nosso tempo – declara – é o vento do Oriente estar dominando o vento do Ocidente. O imperialismo não passa de um tigre de papel!”
Quando Kruschev lhe acentua que a Rússia, por ser o único país do campo socialista a dispor de armamento nuclear, corria os maiores riscos da aniquilamento em caso de guerra, Mao, soberbamente desdenhoso, responde:
“Pode alguém avaliar as perdas humans que uma futura guerra provocará? É possível que atinjam um terço dos 2.700 milhões de seres humanos, o que equivale a 900 milhões... É certo que seria horrível, mas mesmo assim que fosse metade da humanidade fosse aniquilada ainda ficaria a outra metade, mas o imperialismo ficaria completamente aniquilado e só sobreviveria o socialismo, no mundo inteiro, e dentro de meio século ou de um século a população aumentaria de novo e o aumento ultrapassaria essa metade!”
Também há oposição entre Kruschev e Mao quando se trata de saber se os partidos comunistas dos países “burgueses” devem seguir para a conquista do Poder, as vias parlamentares do sistema liberal ou as da insurreição e da luta armada.
Enquanto o líder russo fala da paciência e de moderação, o senhor da China – sabendo que há ouvidos atentos entre as delegações da Ásia, da África e da América Latina – preconiza a luta aberta.
Finalmente, a longa resolução que sai desta conferência – a última reunião em que o movimento comunista internacional parecia ainda um conjunto coerente – é uma justaposição das duas teses, um “puzzle” de princípios contraditórios em que cada um pode encontrar argumentos que apoiem suas ideias. Nem Kruschev nem Mao saíram vencedores da refrega. Obrigados a contentarem-se com um compromisso coxo, separam-se como adversários.
E enquanto o Sr. Kruschev, sabendo-se apoiado pelos partidos europeus, toma o bastão de peregrino da coexistência pacífica, não hesitando em deturpar os sacros santos princípios leninistas para melhorar o nível de vida de sua gente, Mao Tsé-tung volta a Pequim decidido a encontrar a China em suas fronteiras, a acumular etapas, a mostrar o exemplo de um comunismo “duro e puro”, a arrastar os partidos dos países pobres, que vão construir a sua falange, para uma aventura exaltada, digna de que a Rússia viveu depois da Primeira Guerra Mundial.
Em Moscou, Mao pode verificar a atração que sobre todo mundo exerce o estribilho de “paz acima de tudo”. Para bater a influência amolecedora de Kruschev, precisa portanto demonstrar, e imediatamente, um exemplo formidável, grandioso, novo, do comunismo em marcha. E daí sua pressa, sua falta de objetividade e de prudência; por isso o “grande salto em frente” e as “comunas populares”.
Fonte: Mao Tsé-tung, o imperador vermelho de Pequim, de E. Krieg. Páginas 218 a 230.
O assassinato de Marielle Franco pode ter afundado a candidatura de Bernardinho... [ leia mais]
Lula vai ser preso.
Em seguida, o STF deve mandá-lo para a prisão domiciliar... [ leia mais]
Os ministros do STF sabem que, salvando Lula, nunca mais vão poder viajar, ou entrar num restaurante, ou passear nas ruas... [leia mais]

“Fernando Henrique Cardoso demonstra preocupação crescente com a possibilidade de Lula ser preso”, diz a colunista social da Folha de S. Paulo... [leia mais]
A vereadora carioca Marielle Franco, do PSOL, foi assassinada a tiros, agora à noite, no bairro do Estácio... [ leia mais]





Cármen Lúcia sofre ataques sujos do PT; Luís Roberto Barroso sofre ataques sujos do MDB.
PT e MDB são feitos da mesma lama. [ leia mais]
Nas últimas 48 horas, o gabinete de Luís Roberto Barroso foi indagado por três diferentes veículos de comunicação sobre a mesma questão: o ministro julgou algum caso envolvendo... [leia mais]
A defesa de Lula entrou com nova petição no Supremo para tentar evitar a prisão do condenado por corrupção e lavagem de dinheiro após o julgamento de recursos pelo TRF-4... [leia mais]
O potencial eleitoral de Jair Bolsonaro continua a ser subestimado, embora ele seja o primeiro colocado nas pesquisas entre os candidatos de verdade ao Planalto e, ao que tudo...[leia mais]