Curador da mostra “80 anos do Heroísmo Brasileiro”, que abre em Porto Alegre no dia 18 de julho, fala das oito décadas do retorno do 1º escalão dos heróis da Força Expedicionária Brasileira. Eles lutaram na Itália durante a Segunda Guerra Mundial.
Porto Alegre receberá entre 18 de julho e 17 de agosto a exposição "80 anos do Heroísmo Brasileiro", no Museu do Comando Militar do Sul (Andradas, 630). Realizada pela Casa da Memória Unimed Federação/RS e Instituto Unimed/RS, a mostra visa reconhecer e celebrar os combatentes da Força Expedicionária Brasileira (FEB), que lutaram na Itália contra as forças nazifascistas, durante a Segunda Guerra Mundial. A mostra traz capas de jornais e reportagens enfatizando o retorno do 1° escalão ao Brasil, em 18 de julho de 1945, bem como reproduções de desenhos do artista plástico Carlos Scliar, pintados direto do front de batalha.
Legado.
Sob o comando do general gaúcho Mascarenhas de Moraes, a FEB marcou a história militar do Brasil, deixando um legado de coragem que ressoa até hoje. A exposição convida o público a refletir sobre a participação brasileira no maior conflito bélico do século XX. Com patrocínio do Governo do Estado e da Cavaletti S/A, “80 anos do heroísmo brasileiro” representa um chamado para conhecer e valorizar raízes históricas, pois, enquanto Hitler pregava a supremacia de uma raça pura, o Brasil, com sua miscigenação, enviou à guerra soldados de diferentes origens, credos e etnias, estabelecendo contraponto à ideologia defendida pelo Terceiro Reich.
Estado de Guerra.
A entrada do Brasil na batalha foi um ponto de inflexão. Inicialmente neutro, o país sofreu pressão dos EUA para ceder o uso de suas bases estratégicas no Norte e Nordeste. O estopim para a declaração de guerra, no entanto, veio entre fevereiro e agosto de 1942, com o torpedeamento de navios mercantes brasileiros por submarinos alemães, resultando na morte de centenas de civis. A indignação popular e as manifestações de rua pressionaram o governo de Getúlio Vargas a declarar o estado de beligerância em 22 de agosto de 1942, e, finalmente, o estado de guerra contra a Alemanha e a Itália em 31 de agosto. De lambuja, o presidente viabilizou a Companhia Siderúrgica Nacional (CSN).
A FEB
A Força Expedicionária Brasileira (FEB) foi oficialmente estruturada em 9 de agosto de 1943, pela Portaria Ministerial nº 4.744, composta pela 1ª Divisão de Infantaria Expedicionária (1ª DIE) e órgãos não-divisionários. A organização da FEB enfrentou obstáculos, incluindo a transição de métodos de luta e a seleção do contingente. O embarque do 1º Escalão para a Itália ocorreu na noite de 30 de junho para 1º de julho de 1944, no navio norte-americano General Mann. Ao contrário dos planos iniciais – que previam a participação de 100 mil homens, a FEB foi constituída por uma única divisão, com um efetivo de 25.334 combatentes (boa parte dos quais provenientes das camadas “menos favorecidas”).
Na Itália.
A partir de 5 de agosto de 1944, o 1° Escalão da FEB integrou o V Exército norte-americano, comandado pelo general Mark Clark. O objetivo era manter o Exército alemão sob pressão constante, impedindo o deslocamento de suas divisões para outras frentes.
A participação da FEB nos combates iniciou-se em 15 de setembro de 1944, com vitórias iniciais em Massarosa, Camaiore e Monte Prano. Durante visita à Itália do ministro da Guerra, general Eurico Dutra, foi adotado o distintivo "A cobra está fumando", que se tornaria um símbolo de determinação.
Após a conquista do maciço Prano, as tropas brasileiras foram transferidas para o vale do rio Sercchio, aproximando-se de Castelnuovo di Garfagnana. Apesar de um início bem-sucedido, um revés em 31 de outubro forçou o recuo. Com a incorporação dos 2° e 3° destacamentos, Mascarenhas de Moraes assumiu o comando da 1ª Divisão em novembro de 1944, e a FEB foi deslocada para o vale do rio Reno.
A "Operação Defensiva-Agressiva" no Reno incluiu tentativas de conquista de Monte Castelo, uma fortificação estratégica. Depois de eventos malogrados, a virada veio com a Operação Encore, que teve início em 19 de fevereiro de 1945. Com a participação da 10ª Divisão de Montanha norte-americana, da artilharia brasileira, do 1° Regimento de Infantaria (Regimento Sampaio) e da Força Aérea Brasileira (FAB), Monte Castelo foi conquistado em 21 de fevereiro de 1945. A vitória principiou uma série de sucessos para a FEB, incluindo a conquista de La Serra e Monte della Torraccia.
A Operação Primavera, entre abril e maio de 1945, cobriu o Norte da Itália. As tropas brasileiras conquistaram Montese em 14 de abril, e continuaram a ofensiva em direção a Zocca, Vignola, San Polo d'Enza, Montecchio Emilia e Findeza. Em 27 de abril, tomaram Colecchio, e dois dias depois Fornovo, onde a 148ª Divisão alemã e outras forças inimigas capitularam. Em 2 de maio, com o fim das hostilidades na Itália, a divisão brasileira ocupava Alessandria. Conforme a obra “Memórias”, de Mascarenhas de Moraes, a FEB fez mais de 20,5 mil prisioneiros de guerra, dentre os quais dois generais e 892 oficiais.
Solidários.
A campanha brasileira representou a morte de 454 nacionais, sacrifício que reforça a dedicação dos combatentes. Apesar dos horrores do conflito, os expedicionários demonstraram solidariedade, compartilhando alimentos e oferecendo conforto às famílias italianas afetadas pela guerra, deixando uma marca de respeito e amizade que perdura até hoje.
FAB e participação feminina.
Além dos combates em terra, a guerra nos céus também teve participação brasileira. Militares da Força Aérea Brasileira (FAB) realizaram mais de 400 missões, desempenhando funções importantes como bombardeios táticos, patrulhas e suporte às tropas terrestres, em operações de alto risco.
O conflito também abriu espaço para o pioneirismo feminino no Exército Brasileiro. Enfermeiras foram incluídas oficialmente nos esforços de guerra, cuidando de feridos tanto no front quanto nos hospitais de campanha e de retaguarda. A atuação dedicada e competente quebrou barreiras de gênero em um ambiente predominantemente masculino, ampliando o papel da mulher na história militar do país.
Retorno e impacto.
Com o fim da guerra na Europa em maio de 1945, os expedicionários começaram a regressar ao Brasil. O primeiro escalão – desmobilizado por Getúlio Vargas ainda na Itália – desembarcou no Rio de Janeiro em 18 de julho de 1945, dando início ao apoteótico Desfile da Vitória (hoje, pouco lembrado). Milhares de pessoas tomaram as ruas da então capital federal a fim de aplaudir, homenagear e, até mesmo, arrancar as roupas dos soldados, saudando-os por terem colaborado com a derrota do nazifascismo. Escolas, associações, clubes e sindicatos destacaram o esforço dos que partiram com certo descrédito quanto à capacidade de enfrentar as forças do Eixo.
A festa transcorreu ao estilo estadonovista com foco na afirmação de valores cívicos e de união nacional. Bandeiras, guardas de honra e alas de estudantes compunham o aparato. Getúlio decretou feriado nacional. Além do desfile, a data contou com recepções envolvendo autoridades locais e norte-americanas, a exemplo do general Mark Clark.
Mergulho na história.
"80 anos do Heroísmo Brasileiro" compartilha a repercussão do retorno da FEB em mais de uma dezena de veículos de imprensa – incluindo cinco periódicos gaúchos, a partir de julho de 1945. Outro destaque é a inclusão de obras do artista plástico Carlos Scliar, cabo artilheiro da FEB. No intervalo dos conflitos, Scliar retratou o cotidiano em seu “Caderno de Guerra”, apresentando com humanidade a resiliência dos combatentes e das populações locais.
Memória.
A exposição é fruto de um esforço colaborativo, contando com a contribuição do Museu do Comando Militar do Sul, Biblioteca Pública do Estado, Museu da Comunicação Hipólito José da Costa e Museu Gaúcho da FEB, de São Gabriel. A concretização deste projeto só foi possível graças à liderança do presidente da Unimed Federação/RS, Nilson Luiz May, apoio do presidente do Instituto Unimed/RS, Alcides Mandelli Stumpf, e à dedicação de Armando Burd, Cristiane Von Appen, Isabel Cunha de Paula e Amanda Santos, com participação de Wremyr Scliar.
Mesa-redonda.
Como parte da programação, dia 2 de agosto, às 9h30min, será realizada mesa com especialistas na Casa da Memória Unimed Federação/RS (Santa Terezinha, 263, Porto Alegre).
Correio do Povo

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