Morando com vista privilegiada, família dos maiores roedores viventes do mundo é monitorada pela Prefeitura, que nunca havia registrado estes animais na área urbana
Há poucas semanas, Porto Alegre passou a ter novas cidadãs, afeitos à docilidade e com vista privilegiada para o Guaíba. Sete capivaras, espécie cuja caça é proibida por lei, passaram a residir na relva às margens do final do Arroio Dilúvio, no bairro Praia de Belas. Chegando de mansinho, uma fêmea, um macho e cinco filhotes chamam a atenção de quem passa pelo local.
Isto fez com que a Empresa Pública de Transporte e Circulação (EPTC), em conjunto com as secretarias municipais do Meio Ambiente, Urbanismo e Sustentabilidade (Smamus) e do Gabinete da Causa Animal (GCA), instalasse placas na semana passada alertando para a presença de exemplares do maior roedor vivente do mundo, cujos adultos podem pesar até 75 quilos, segundo a Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). No entanto, o GCA reconhece que a sinalização, que somente informa sobre a presença destes animais, pode ser melhor informativa, com alertas sobre as possíveis responsabilizações criminais pelo manejo destes animais.
A presença da fêmea já é observada por comerciantes locais desde o final do ano passado, segundo a secretária do GCA, Tatiana Guerra. “Elas não têm predadores, e ali têm um local calmo para se alojar, além de um alimento abundante”, diz ela. Herbívora e semiaquática, a capivara, cujo status é de animal “pouco preocupante”, conforme a Lista Vermelha da União Internacional para a Conservação da Natureza (IUCN, na sigla em inglês), encontrou na região uma ampla presença de gramíneas, seu principal alimento, salientou Tatiana.
“Mas temos relatos de que não houve um aumento expressivo, porque há relatos da Patrulha Ambiental da Brigada Militar (Patram) e outros setores da Secretaria Estadual do Meio Ambiente e Infraestrutura (Sema) de que sempre apareceram capivaras na nossa orla”, acrescentou. A hipótese mais provável, diz ela, é a de as enchentes de um ano atrás tenham relação com sua chegada, já que a capivara, de nome científico Hydrochoerus hydrochaeris, é relativamente comum na região do Arquipélago, especificamente nas ilhas da Pintada e Jangadeiros, além do bairro Lami, no Extremo Sul, porém, na área urbana de Porto Alegre, nunca havia sido vista antes.
Animal pouco preocupante no mundo
Na América do Sul, segundo o IUCN, é encontrada em todo o território a leste da Cordilheira dos Andes, da Venezuela ao Uruguai, incluindo a totalidade do território brasileiro, até a região de Buenos Aires, na Argentina. Para o professor Demétrio Luis Guadagnin, especialista em fauna silvestre do Departamento de Ecologia da UFRGS, capivaras são animais generalistas, que não têm muitas exigências para instalação em um local.
“Se elas forem perturbadas de uma forma importante, vão acabar abandonando a área. Caso contrário, se perceberem que não estão sofrendo nenhuma ameaça, de pessoas ou cães se aproximando em demasia, elas se acostumam”, salienta ele. De qualquer maneira, o risco é baixo de a capivara apresentar agressividade, conquanto o principal perigo é ser possível vetor de doenças. “Todo animal silvestre ou doméstico, não tem um tutor e não é vacinado, pode ser inclusive um cavalo, e sem os cuidados veterinários adequados, está sujeito a ter um parasita que pode ser transmitido para a pessoa”.
Elas são animais sociais, e quanto maior o bando, mais tempo elas conseguem permanecer em um local, na hipótese de haver bastante alimento. Em abril, a imprensa internacional noticiou a invasão delas a um condomínio de luxo em um subúrbio nobre de Buenos Aires. Com três vezes mais exemplares do que há dois anos, as capivaras passaram a causar dores de cabeça aos moradores locais. Mas a chance disto acontecer em Porto Alegre é bastante remota, afirma Guadagnin, porque a área disponível para a circulação delas na capital gaúcha é muito menor do que no caso da maior cidade argentina.
Do mesmo jeito, é pouco provável que elas saiam da grama e circulem pelo asfalto da região. “Por este ser um espaço restrito, nunca haverá uma quantidade muito grande de capivaras ali. Porém, nada impede que elas consigam seguir subindo o Dilúvio e colonizando outros setores do rio”, diz o professor. Enquanto isso, diz Tatiana, a população inclusive está indo ao local para tomar chimarrão e colocando cadeiras para sentar e observar estes animais. Ou seja, a área virou turística. Em caso de dúvidas, o telefone 156, com o GCA, pode ser contatado.
Com um projeto de revitalização do arroio Dilúvio em andamento na Prefeitura, o fato novo da presença das capivaras pode se tornar outro ponto de atenção. Uma questão é certa: a convivência entre seres humanos e esta nova família precisa acontecer de maneira harmônica. “Enquanto este relacionamento estiver tranquilo, não há que ser tomada nenhuma atitude com relação a elas. Agora, se acontecer de a população aumentar até o ponto em que elas passam a se tornar desagradáveis para as pessoas, aí se precisa ter uma estratégia de controle e remoção de indivíduos, dentro de um nível socialmente aceitável”, acrescenta Guadagnin.
Correio do Povo
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