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terça-feira, 22 de novembro de 2022

Copa do Mundo: torcedores iranianos vivem o paradoxo de "incentivar com tristeza"

 Jogadores se recusaram a cantar o hino nacional

Chorando, uma torcedora observa os jogadores do Irã se recusando a cantar o hino nacional. O movimento de protesto no país, duramente reprimido, se estendeu nesta segunda-feira ao primeiro jogo do 'Team Melli' na Copa do Mundo, que terminou com a derrota por 6-2 para a Inglaterra.

Perguntado esta semana sobre o apoio aos manifestantes, o capitão Alireza Jahanbakhsh, que joga no clube holandês Feyenoord, disse que a decisão seria tomada coletivamente. E assim foi. Os onze jogadores se mantiveram impassíveis e com a expressão neutra durante a execução do hino no Estádio Internacional Khalifa.

A exceção foi um membro da delegação, vestindo terno e sentando no banco. O Irã é sacudido por uma onda de protestos desde a morte, em 16 de setembro, de Mahsa Amini, uma curda iraniana de 22 anos, detida por violar o estrito código de vestuário, que obriga as mulheres a usarem o véu em público.

'Liberdade, liberdade!'

Segundo um balanço publicado no sábado pela ONG Iran Human Rights (IHR), a repressão das autoridades deixou 378 mortos e cerca de 15.000 pessoas foram detidas. Entre os milhares de torcedores presentes em Doha, parte chegou procedente do Irã (Teerã fica a três horas de avião) e outros vieram da diáspora, caso de Sam, de 34 anos, que viajou com amigos de San Francisco.

O grupo usava camisetas com a inscrição 'Woman Life Freedom' (Mulher Vida Liberdade), que não deixa dúvidas sobre sua posição contrária ao regime da República Islâmica. "Esta partida é uma oportunidade para apoiarmos as pessoas que dão sua vida pela liberdade. Podemos desempenhar um papel pequeno, não é grande coisa, mas é o único que podemos fazer atualmente", disse Sam antes de entrar no estádio, sem que sua camiseta tivesse chamado a atenção do pessoal da segurança.

O lema, símbolo da revolta, também foi visto em um cartaz exibido no estádio antes do início da partida e que desapareceu em seguida. Rose, de 38 anos, teve menos sorte: "Pediram para que eu trocasse a camiseta porque dizia 'Liberdade para o Irã'".

Ao contrário, apesar da convocação recebida por muitos iranianos via redes sociais para repetir o nome de Mahsa Amini aos 22 minutos da partida, em alusão à idade da jovem morta, nada aconteceu, segundo jornalistas da AFP presentes no local.

Mas foram ouvidos cânticos de 'Azadi, Azadi!' (Liberdade, liberdade!') das arquibancadas. Saeid Sharifi, de 46 anos, veio de Teerã: "Não estamos contentes com a situação no Irã, mas é nosso dever apoiar a seleção nacional".

"Viemos torcer. Estamos tristes, mas estamos aqui para incentivar [o time]. Incentivamos com tristeza", resumiu Masud Hashemi, de 44 anos. Na capital iraniana, apenas 200 pessoas se reuniram diante de um telão junto à Biblioteca Nacional para acompanhar a partida, entre eles o jovem Farzid, de 21 anos. "Sempre torci pela Seleção, mas desta vez, não, porque os jogadores não apoiaram o povo. Desta vez, não estou contrariado pela derrota da equipe nacional".

Protesto em Londres

Longe de Doha, na Inglaterra, o jogo representava um conflito para os britânicos-iranianos, divididos em para quem torcer. Em um pub do oeste de Londres, um grupo de mulheres com dupla nacionalidade, muitas delas ativistas contra o regime de Teerã, se reuniram para acompanhar a partida, aproveitando a ocasião para organizar um protesto.

Quando as telas da TV mostraram a execução do hino iraniano, elas deram as costas e vaiaram. Elas têm programadas ações similares nos demais jogos da equipe persa. "É muito conflituoso", disse a artista Fari Bradley, nascida no Irã e cidadã britânica, que mora desde o fim dos anos 1970 no país. Ela veste uma camiseta que diz, 'Irã' e o lema 'Mulher, vida, liberdade'. "Não deveríamos torcer pela equipe porque o regime o usa", disse sobre o conflito de interesses que vive.

Após o jogo, o técnico iraniano, o português Carlos Queiroz, tomou a palavra. "Não é certo vir para este Mundial e pedir que façam coisas que não são sua responsabilidade. Eles querem trazer orgulho e alegria para as pessoas", disse sobre a pressão que sua equipe sofre.


AFP e Correio do Povo

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