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segunda-feira, 1 de agosto de 2022

Acessíveis, ágeis e baratos: como drones permitem que Ucrânia enfrente uma superpotência como a Rússia

 Especialistas explicam que essa aeronave permite que países menores entrem em conflito potências militares e levem vantagem no setor aéreo, mas apontam que é preciso ter cuidado na implementação do equipamento

Soldado ucraniano lança drone em Kharkiv em meio à invasão russa da Ucrânia

Para além dos tanques de guerra, outro equipamento tem sido crucial no campo de batalha: os drones. Esse veículo aéreo não tripulado é flexível, ágil, acessível, de fácil reposição e está mudando significativamente o curso das guerras e poupando a vida de combatentes. Além dessas praticidades, eles podem carregar várias ogivas e serem letais. Há estudos em curso para que essa aeronave remotamente pilotada possa ser utilizada para fazer transporte de cargas e feridos, o que facilitaria no resgate e salvamento de soldados. Um diferencial que os drones oferecem é a possibilidade de reduzir gastos militares de maneira significativa. Países pequenos, que não possuem grande orçamento militar — e, portanto, não compram aeronaves caras —, podem entrar em conflitos diante de uma potência e ainda conseguirem superioridade aérea.

Esse é o cenário observado no conflito entre Rússia e Ucrânia, que acontece desde o dia 24 de fevereiro. No início, os russos acharam que iam dominar o espaço aéreo ucraniano com facilidade. Muito se debateu o motivo pelo qual as tropas de Vladimir Putin não terem conseguido supremacia aérea. Dentre as várias razões está o fato de o país de Volodymyr Zelensky ter utilizado drones para se defender. A utilização deste equipamento já estava em curso antes mesmo da invasão. As forças armadas ucranianas usaram drones turcos contra os separatistas em Donbass, o que gerou preocupação na Rússia.

Bernardo Wahl, professor de Segurança Internacional da Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo (FESPSP), fala que, ao longo do século XX, as guerras eram vencidas por quem tinha grande aptidão militar (ou seja, as superpotências). “Os países menores não podiam se envolver porque não tinham recursos para isso, mas a evolução da tecnologia mudou tudo, os drones permitem que potenciais menores enfrentem potenciais maiores”, analisou. Ele lembra que a Rússia “queria destruir a Ucrânia com armas antigas”, mas os drones desempenharam um papel crucial na defesa ucraniana. Wahl ressalta que este conflito “é o laboratório para discutirmos e debatermos estrategia militares e o futuro da guerra”.


No entanto, esta não foi a primeira vez que se pôde observar uma vantagem bélica para quem fez o uso de drones. No confronto entre Azerbaijão e Armênia de 2020, pelo controle da região de Nagorno-Karabakh, as forças azerbaijanas destruíram vários veículos de guerra adversários com o Bayraktar TB2, um veículo aéreo não tripulado utilizado para prospecção e levantamento de informações e para neutralizar alvos em solo. Foi fundamental para o Azerbaijão eliminar as forças blindadas e logísticas da Armênia e terem supremacia aérea em todo o conflito. Esse evento, conhecido como guerra dos drones, foi um marco da ascensão deste equipamento, que, como conta Matheus Brazão, fundador da Lawant, consultoria para drones, foi projetado com”intuito militar para espionagem e ataque”(o que acabou disseminando certo temor).

Esse receio tem origem no ataque de 11 de setembro nos Estados Unidos. Bernardo Wahl explica que, após esse episódio, os drones se tornaram parte integrante dos conflitos internacionais. “Os EUA lançaram a guerra global ao terror, que foi marcada pelo uso em larga escala de drones em operações contra terrorismo para eliminar membros da Al-Qaeda.” Essa guerra global ao terror, afirma o professor, marcou a ascensão moderna dessas aeronaves. Contudo, Brazão pontua que, com o desenvolvimento da tecnologia, o equipamento começou a ter outras funções como: capturas de vídeos, transporte, inspeção, mapeamento e fotografia.

A facilidade de acesso aos drones faz com que qualquer pessoa possa comprar pela internet, explica o fundador da Lawant. Ele pontua que a utilização desse produto em zona de conflito é importante porque, além de possibilitarem ataques a distância, dá segurança para as tropas. Sua agilidade permite que seja possível levar informação de um lado para o outro, o que faz com que os ataques sejam mais efetivos na hora da execução. Bernardo acrescenta quatro pontos que fazem com que essa aeronave seja vantajosa. O primeiro deles é o fato de os drones não terem pilotos e serem controlados remotamente. A segunda vantagem é que eles não expõem os soldados e podem ser implantados rapidamente, por longos períodos, além de serem letais, com menor custo financeiro e menos risco de vida para aqueles que o utilizam. Outro ponto forte é que o sistema de defesa aérea tem dificuldade de detectá-los devido ao seu tamanho. Só vai ser possível visualizar esses equipamentos se o país tiver um sistema de defesa aérea robusto. “Então, são vantajosos quando o inimigo não possui sistema de defesa aéreo”, conclui.

Drone turco Bayraktar TB2, utilizado pela Ucrânia no conflito contra Rússia │PETRAS MALUKAS/AFP


Contudo, o professor chama atenção para o risco em utilizar os drones em uma guerra. “Eles não fazem diferenciação de alvo. Se ele está automatizado para atacar, vai fazer isso”, diz Wahl, lembrando que os equipamentos não conseguem entender o que significa uma bandeira branca. Para entender como os drones funcionam, é preciso saber que existem diferentes modelos: aqueles que são autônomos (agem de forma independente, não retornam para onde saíram, são considerados camicazes), automatizados (podem ser controlados por um aplicativo, com o qual você traça plano de voo para que ele volte depois de cumprir a sua obrigação) e os que precisam de um piloto para operar.

Wendel Brazão, irmão de Matheus e instrutor especialista em drones na Lawant, explica que “há uma crítica muito grande” em relação aos drones autônomos e automatizados, porque ninguém sabe qual o limite do equipamento. Uma vez que ele for programado para executar determinada função, vai até o final. “Ou seja, mesmo que o alvo para o qual foi direcionado se renda, eles não vão parar”. Wendel destaca que não existe um drone que seja “o melhor” ou “mais recomendado” para guerra. “Vai depender da demanda e do objetivo. Se você quer só levantamento, vai usar um tipo específico de aeronave. Se quer ataque e levantamento, vai ser outro tipo específico. E se quer drone camicaze ou suicidas, também existe uma linha específica de drones”, explica.

Os especialistas pontuam que o drone é uma arma poderosa, e os últimos conflitos provaram isso. A guerra do Azerbaijão foi “o divisor de água”, segundo Wendel. “Ali a população mundial olhou e falou: ‘Temos que ter cuidado e pensar na legislação internacional’. Esses veículos não podem ser usados de forma indiscriminada.” Isso porque, segundo o instrutor, corre o risco de cair como arma em mãos erradas. Ele traz como exemplo o que tem sido observado na guerra entre Rússia e Ucrânia. “Os equipamentos estão sendo mercanciados em fronteiras distantes do ponto do conflito, para o equipamento chegar em outros locais é um estalo.” Existem dois tipos de drones, aqueles com fins militares, mais específicos, e os civis. Contudo, até uma aeronave civil pode ser letal.



Felipe Calixto, coordenador do ITARC, uma escola de drone, traz como exemplo o exército ucraniano que estava utilizando equipamentos da DJI, uma empresa chinesa que produz drones civis com fins militares. “Eles adaptaram equipamentos com dispositivos que lançava bomba”, explica. Calixto diz que esses produtos mais simples, a qual qualquer pessoa tem acesso, “tem uma capacidade de carga pequena, mas o suficiente para os objetivos do exército”. Mesmo fazendo um voo simples, já se torna útil em um conflito porque, além dele poder executar uma série de atividades, já não pode ser observado com facilidade. Felipe ressalta que não é fácil adaptar um drone. “É preciso conhecimento”, diz, mas também adverte: “Também não é complexo”. Nessas circunstâncias, ele vira uma ferramenta que pode ser projetada para se tornar uma arma poderosa.

Apesar da boa funcionalidade dos drones, os especialistas não acreditam que eles vão substituir os tanques de guerra. Wendel fala que eventualmente vão haver dispositivos que conseguirão destruir tanques de guerra e que, em razão da “praticidade, portabilidade, preço e peso”, passarão a ser utilizados com mais frequência — e os tanques para atos pontuais. Ele ressalta que cada equipamento tem uma especificidade, mas os dois se complementam. Segundo o instrutor, quem tiver uma quantidade significativa de drones conseguirá abater tropas. Bernardo destaca que essa aeronave “não superou o tanque de guerra, principalmente se ele for muito sofisticado”. A diferença é que os veículos aéreos não tripulados têm mais mobilidade — o que não indica que o tanque esteja obsoleto. “Drones são leves, de fácil deslocamento e não necessariamente precisam de uma grande equipe para operá-lo. Isso faz com que eles deem mais flexibilidade e velocidade em uma guerra.”


Jovem Pan

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