AdsTerra

banner

quarta-feira, 19 de agosto de 2015

O Papa e o divórcio, por Fernando Malheiros

Quem poderia imaginar que a Igreja Católica dobrar-se-ia às evidências, pondo o pragmatismo à frente do dogmatismo?
Os sinais de que esse processo se instaurou com a chegada do pontifício de Francisco são variados. São os tempos, como tratou deles o Eclesiastes. Há o ineditismo de o Papa ser sul-americano e, mais ainda, argentino, com tudo o que isso significa. O Papa também é jesuíta, provindo de uma ordem criada pela Contra-Reforma para dar solidez à Igreja claudicante pela Reforma Protestante.
Dizendo a que veio, o Papa afrouxou a repelência aos gays, marca conservadora e dogmática da Igreja, e agora abre os braços aos divorciados. Venceu o pragmatismo em tempos nos quais o monólito já se fragmentou e a perda de fiéis preocupa o futuro da Santa Instituição.
Segundo o Papa, é preciso abraçar os divorciados, ainda que sem conceder a forma, sacramental ao segundo matrimônio, mas para garantir a criação católica aos filhos das segundas núpcias, ou mesmo de outra união nesses tempos de informalismo.
Aos que, católicos e casados, não suportarem o aziago do mau casamento e não virem alternativa senão o divórcio, uma boa notícia: poderão ser arrebanhados à nação que os desdenhou e agora reconhece que também pertencem ao povo de Deus, assim também os filhos que provieram das uniões posteriores, e os filhos destes, para todo o sempre, que poderão ainda solteiros receber a bênção clerical para a primeira união. Fraquejando, poderão sobreviver.
Não se trata de uma capitulação, embora a mudança de discurso seja drástica considerada a dogmática que lhe antecedeu. É o tempo atuando nas instituições com sua indelével força modificadora. Ainda que a palavra de Deus seja única, sua interpretação pode ser alterada, mesmo que para o contrário da anterior.
Melhor assim, que a religião se curve às necessidades humanas, pois é de homens que ela tem de cuidar, não de santos que, por sua santidade, já pertencem à outra dimensão.

Advogado de Família




Fonte: Correio do Povo, editorial da edição de 19 de agosto de 2015, página 2.

Nenhum comentário:

Postar um comentário