segunda-feira, 13 de maio de 2024

Ihados, moradores do Centro Histórico permanecem em prédio para proteger o edifício

 Grupo ‘Resistência’ tem feito a manutenção e organização do local onde vivem

Fachada do edifício Mal. Trompowski no Centro Histórico 

Há uma semana, 10 moradores do edifício Mal. Trompowski, na av. Siqueira Campos, decidiram criar uma comuna. Juntos, o grupo escolheu não deixar o prédio com do avanço da água sobre as ruas do Centro Histórico, e que já submergiu o primeiro andar do prédio. O motivo? Manter a segurança e a manutenção do local que vivem. Juntos, limpam, reparam e mantém a segurança do prédio de 21º andares. A divisão das tarefas é coordenada e os suprimentos, principalmente a água, é racionado e igualmente compartilhado para que ninguém passe fome ou fique sem comer. A energia também é limitada, o gerador é ligado apenas para o carregamento de telefones e lanternas. A caixa d’água foi aberta e permite o ‘banho a conta gotas’ diário.

A decisão do grupo de permanecer no prédio recebeu apoio dos demais moradores que optaram por deixar seus apartamentos. Em apoio, aqueles que não entregaram diretamente mantimentos, deixaram as chaves de suas casas para que os que ficassem pudessem entrar e pegar o que fosse preciso. Outros seguem levando mantimentos, por meio de barco, aos vizinhos. Também de barco, levam o lixo dos que ficaram.

Luiz Calos Modesto, 54, quando veio de São Paulo para o Rio Grande do Sul, há 14 anos, nunca imaginou que passar situação igual, tampouco que sofreria tanto vendo o Estado pelo qual se apaixonou debaixo d'água. Decidiu ficar em acordo com a esposa, Ana Elisa Fontoura, gaúcha, que defendeu: "Lu, a gente tem tudo aqui e tem nosso gato também. Estamos com água, estamos alimento, vamos para ficar a não ser que eles mandem a gente sair em função de algum perigo". Foi assim que os dois se somaram ao grupo denominado Resistência que tem feito toda organização e limpeza do local desde então.

"Limpamos e desinfetamos todos os apartamentos para quando os moradores de idade, o pessoal que evacuou, quando eles voltarem o prédio e os andares vão estar limpos e dedetizados. Só a recepção do prédio que está completamente debaixo d'água e é onde a gente vai fazer uma limpeza mais grossa", explicou Luiz. Todas as tarefas são compartilhadas, e cabe a Carol, esposa do síndico, Evair, coordenar a atuação. Nesta sexta-feira, a tarefa de Luiz foi limpar todos os degraiu, do 2º ao 21º andar. Sem vassoura ou rodo, foi na mão mesmo.

Uma das vistas da da janela do ed. Mal. Trompowski Uma das vistas da da janela do ed. Mal. Trompowski | Foto: Luiz Carlos Modesto/ Arquivo Pessoal / CP

Reforçando o sentimento de comunidade, algumas alimentações são feitas em conjunto e conversa ajuda a passar o tempo. Mas, na hora de dormir, cada morador vai para os seus respectivos apartamentos. Uns, acompanhados dos seus animais de estimação – cujo os estoques de alimentação estão devidamente abastecidos. Outros, acompanhados dos seus companheiros, como Luiz e Ana Elise. O casal, nos poucos momentos em que não estão dedicados aos afazeres do prédio, se distraem como podem. Ela, lê e costura. Ele, pratica plastimodelismo.

Técnico em mecânica industrial, Luiz já está estudando maneiras de reerguer e reativar as bombas do edifício, assim como o gerador a fim de prevenir prejuízos caso situações extremas como essa venham acontecer. Apaixonado pelo que faz, o trabalho – e o caminho, a pé, que faz até lá – são uma das maiores saudades de Luiz. Em meio ao "cenário de guerra", descrito por ele, fez um apelo ao poder público: que dê a atenção devida aos anseios e necessidades do Estado, principalmente na infraestrutura. "Isso está sendo ruim, mas em contrapartida está sendo bom para eles (políticos) verem o quanto estão errando e os pontos que estão deixando de ver a gente e o que a cidade precisa", afirmou.

Luiz Carlos Modesto varanda na frente do prédio Luiz Carlos Modesto varanda na frente do prédio | Foto: Luiz Carlos Modesto/ Arquivo Pessoal / CP

Apesar disso, quando questionado se, após tudo que têm passado, ele pensa em deixar o Estado e retornar para terra natal, é taxativo: "ao contrário, agora é que eu quero ficar. O Rio Grande do Sul precisa de mim, eu tenho com o que contribuir e dar minha participação. O Rio Grande do Sul tem um povo maravilhoso e o que ele estão sentindo, eu também estou sentindo. Eu falo para os meus amigos de São Paulo: 'eu tô aqui e quero fazer esse Estado de novo do jeito lindo que ele é'".

Correio do Povo

Nenhum comentário:

Postar um comentário