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domingo, 24 de abril de 2022

Decisão sobre indulto de Bolsonaro a Daniel Silveira envolveu núcleo militar e líderes do Centrão

 


A decisão do presidente Jair Bolsonaro de partir para o enfrentamento contra o Supremo Tribunal Federal (STF) para defender um deputado envolveu tanto assessores do núcleo militar do governo quanto aliados do Centrão, diz o jornal O Globo na edição deste domingo (24).

Generais que despacham no Palácio do Planalto desde o início incentivaram Bolsonaro a editar o decreto com o objetivo de perdoar Daniel Silveira (PTB-RJ). Já o ministro da Casa Civil, Ciro Nogueira, expoente da ala política, a princípio defendeu uma solução via Congresso, mas passou a também dar respaldo à medida mais dura, que ganhou o apoio de líderes de partidos da base após a sua publicação. Hoje, todos descartam qualquer possibilidade de o indulto individual (graça) concedido a Silveira ser derrubado no Parlamento.

A ideia de Nogueira era deixar para a Câmara o desgaste de derrubar ao menos em parte as punições impostas a Silveira, mas Bolsonaro viu no episódio uma forma de enviar um “recado” à Corte, principalmente ao ministro Alexandre de Moraes, relator do caso e seu alvo preferencial no Supremo. O presidente e seus aliados mais próximos tinham o indulto como opção caso alguma das investigações em curso no STF atingisse seus filhos, em especial o deputado Eduardo Bolsonaro (PL-SP) e o vereador do Rio Carlos Bolsonaro (Republicanos-RJ), informa a publicação.

Para tomar a decisão, Bolsonaro ouviu auxiliares oriundos da caserna, críticos a decisões recentes do STF, como a que proibiu a posse de Alexandre Ramagem no comando da Polícia Federal, em abril de 2020. Um dos militares consultados foi o ex-ministro Walter Braga Netto, que é general da reserva e atualmente atua como assessor da Presidência, além de ser o mais cotado para ocupar o posto de vice na chapa à reeleição do presidente. Também fazem parte do grupo dos que foram consultados os ministros Augusto Heleno (Gabinete de Segurança Institucional) e Luiz Eduardo Ramos (Secretaria-Geral), ambos igualmente generais.

A redação final do decreto foi fechada numa reunião na manhã de quinta-feira no Palácio da Alvorada com a presença dos ministros Bruno Bianco (Advocacia-Geral da União) e Célio Faria Júnior (Secretaria de Governo), do secretário para Assuntos Estratégicos, Flávio Rocha, e do subchefe de Assuntos Jurídicos, Pedro Cesar Sousa. Próximo a Bolsonaro, o ministro do Tribunal de Contas da União (TCU) Jorge Oliveira foi outro a participar do encontro.

O decreto que concedeu a Silveira o instituto da graça foi considerado uma afronta por integrantes do Supremo, que na véspera havia condenado o deputado a oito anos e nove meses de prisão por declarações em que ameaça agredir ministros e incita o fechamento da Corte. Mesmo após passar os primeiros anos de seu mandato fazendo ameaças contra o STF e seus ministros, Bolsonaro até hoje não havia usado de suas prerrogativas para confrontar uma decisão do tribunal, elevando a tensão na Praça dos Três Poderes a níveis inéditos.

Movimento da Câmara

A edição de uma medida específica para tentar livrar Silveira das penas impostas pela Corte já vinha sendo discutida pelo presidente com seus auxiliares mais próximos há pelo menos duas semanas, antes mesmo de o STF tomar qualquer decisão sobre o tema. O esboço do texto já estava pronto antes do julgamento, na quarta-feira.

O plano de Ciro Nogueira, porém, passava por um acordo com o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), para que a Casa pudesse ao menos impedir a perda de mandato de Silveira, que também foi determinada pelo STF. Na quarta-feira, enquanto o julgamento ainda ocorria, Lira apresentou à Corte um pedido para que a palavra final em questões desse tipo seja decidida pelo Legislativo. A sugestão de Nogueira, no entanto, não foi aceita por Bolsonaro, que preferiu seguir adiante com o decreto.

Dentro da base aliada, o discurso é de que o decreto é constitucional e que não há espaço para o Supremo descumpri-lo.

“Acho que o presidente Bolsonaro usou sua prerrogativa, absolutamente dentro da Constituição”, afirmou o líder do PL na Câmara, deputado Altineu Côrtes (RJ). “Espero que por parte do Supremo Tribunal Federal não tenha nenhuma retaliação ao governo”.

Parlamentares de oposição apresentaram projetos de decreto legislativo (PDLs) que visam a derrubar o indulto. Entretanto, teriam que conseguir maioria na Câmara e no Senado, o que é considerado difícil. Líderes de partidos aliados não veem espaço para o ato do presidente ser derrubado no Congresso.

Além disso, o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), afirmou em entrevista na sexta-feira entender que o Parlamento não poderia sustar o texto, pois ele respeitou a Constituição.

No Supremo, a questão tem sido tratada como um desafio: ministros veem a necessidade de responder de forma firme, mas sem cair no que classificam como “cilada” de Bolsonaro, para evitar uma escalada na crise. A intenção de integrantes da Corte é não questionar a legalidade do decreto, que consideram ser um direito do presidente, mas se ater na possibilidade ou não de Silveira manter seus direitos políticos e ser candidato nas eleições de outubro.

A tática entre os magistrados tem sido a da cautela, evitando declarações públicas a respeito do decreto, optando por se manifestar apenas quando forem analisar os questionamentos que chegaram à Corte.

Ministros ouvidos em caráter reservado dizem que a intenção é baixar a fervura e avaliar o cenário com mais calma. Contribuiu para isso o fato de a ministra Rosa Weber ter sido sorteada como relatora. De perfil discreto, ela raramente concede entrevistas e evita se posicionar fora dos autos sobre assuntos em discussão no tribunal.

A escalada do caso Daniel Silveira

Prisão após ataques

O deputado Daniel Silveira (RJ), hoje no PTB, foi preso em fevereiro do ano passado, por determinação de Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), após divulgar um vídeo com ameaças e ataques aos ministros da Corte.

Deputado vira réu

Por unanimidade, o plenário do STF recebeu a denúncia feita pela Procuradoria-Geral da República (PGR) contra Silveira, transformando-o em réu. Ele foi acusado de incitar a violência para impedir o livre exercício dos Poderes Legislativo e Judiciário.

Prisão revogada

Moraes revogou a prisão do deputado em novembro do ano passado, com a condição de que ele não usasse redes sociais nem tivesse contato com outros investigados por ataques ao STF. Em março, Silveira já tinha ido para prisão domiciliar com tornozeleira.

Novas ofensas

Silveira participou de um evento conservador no dia 20 de março deste ano, no qual deu entrevistas e proferiu ofensas contra Moraes. Ele estava acompanha do presidente do PTB paulista, o empresário Otávio Fakhoury, que é investigado no inquérito das fake news, no STF.

Volta da tornozeleira

No fim do mês passado, Moraes determinou que Silveira voltasse a usar tornozeleira eletrônica, após o parlamentar descumprir as medidas determinadas pela Corte.

Resistência à decisão

Silveira se recusou a cumprir a ordem de Moraes. Ele chegou a passar a noite em seu gabinete, na Câmara. O deputado recolocou a tornozeleira após Moraes determinar uma multa diária de R$ 15 mil e o bloqueio de contas bancárias.

Julgamento no STF

O plenário do Supremo condenou Silveira por ameaças e incitação à violência contra ministros da Corte no último dia 20. A decisão foi tomada por dez votos a um. O deputado foi condenado, seguindo o voto do relator, Alexandre de Moraes, a oito anos e nove meses de reclusão em regime inicial fechado, além do pagamento de multa e perda do mandato e dos direitos políticos enquanto durarem os efeitos da pena.

Indulto presidencial

Horas após o julgamento, o presidente Jair Bolsonaro, aliado de Silveira, editou um decreto em que concedeu indulto individual (graça) ao deputado. O instrumento funciona como perdão da pena.

O Sul

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