Tragédia da Chuva em São Paulo: o drama de quem perdeu tudo
Francisco Morato- Estragos causados pelas fortes chuvas que atingiram a cidade na madrugada desta sexta-feira (11)
Um dia depois de ver a sua moradia desaparecer em meio a lama e terra, Valdiceia Pereira da Silva, de 48 anos, tentava se ajeitar no novo ”lar” temporário: o Centro Cultural de Franco da Rocha, um dos 23 municípios do estado de São Paulo castigado pelas fortes chuvas registradas entre a noite de quinta-feira (10) e a madrugada de ontem (11).
Na cidade, localizada ao norte da Grande São Paulo, uma pessoa morreu e 240 ficaram desalojadas. A maioria foi para casa de parentes ou amigos. Desses, 57 que não tinham para onde ir, estão acomodadas em dois abrigos municipais dos quais 50 ocupam as instalações do Centro Cultural, visitado hoje (12) pela manhã pela presidenta Dilma Rousseff.
Presidenta Dilma Rousseff visita famílias desabrigadas pela chuvas em São Paulo e conversa com Valdiceia
A presença da presidenta animou Valdiceia que espera, a partir de agora, rapidez na entrega das chaves da casa a que foi contemplada pelo Programa Minha Casa, Minha Vida. “Espero sair daqui direto para o apartamento”. Ela disse ainda que foi “um milagre” ter sobrevivido junto com o marido, o filho, de 32 anos, e o neto, de 7 meses, quando a tromba d'água passou pelo barraco de madeira onde viviam, no bairro Lago Azul Alto.
“Eu escutei um barulhinho e acordei meu marido, que se levantou rápido e já foi mandando a gente sair de lá. Foi o tempo do meu marido segurar uma tábua para a gente passar e logo tudo caiu”, disse.
Além de servidores municipais muitos voluntários passaram o dia ajudando a atender os desabrigados que receberam kits de higiene pessoal e alimentação. No almoço, foi servido arroz e frango. E a todo instante chegavam donativos, principalmente, calçados e roupas.
Procura pelo filho
Em meio aos desabrigados, uma situação bem peculiar chamava atenção no Centro Cultural. Muito aflita, a moradora de São Paulo, Maria Raimunda Marcílio Santos Oliveira, de 46 anos, procurava pelo filho de 20 anos, que desapareceu, justamente, na noite das fortes chuvas. Ela disse que o rapaz é deficiente mental e sempre vai para a casa da pastora de uma igreja evangélica de Franco da Rocha. “Eu fui até a casa dela, mas ele não chegou lá”, disse lamentando não tê-lo encontrado até aquela hora.
Franco da Rocha é cortada pela Linha 8, Rubi, de trem da Companhia Paulista de Trens Metropolitanos (CPTM) e ainda pelos rios Juqueri e Formoso e também pelo Ribeirão Eusébio, que transbordaram e inundaram várias ruas das áreas mais baixas da cidade. Muitas vias ainda estavam alagadas ou cheia de barro neste sábado. Vários agentes de trânsito também orientavam os motoristas sobre as mudanças de direção por causa dos bloqueios, o que deixou o tráfego confuso durante o dia e com muito congestionamento.
Na cidade, a única morte registrada até agora é de um homem, segundo a prefeitura, ele foi resgatado próximo ao supermercado Russi, no centro, ainda com vida, mas que morreu no hospital. “Aparentemente ele tentou atravessar o alagamento e se afogou”. diz a nota. Com isso, segundo o Corpo de Bombeiros, o número de mortes até agora na tragédia subiu para 20. A corporação concentrou os trabalhos deste sábado em busca de cinco desaparecidos em Mairiporã, também na região metropolitana, onde cinco pessoas morreram e sete ficaram feridas.
A prefeitura informou também que, a partir de amanhã (13) , deve escoar toda a água dos pontos que continuavam alagados hoje, no centro da cidade e na Vila Nossa Senhora Aparecida porque “a represa Paiva Castro finalmente atingiu o nível ideal e as comportas foram fechadas às 17h de hoje”.
A nota diz ainda que, no encontro com a presidenta Dilma Rousseff e o governador Geraldo Alckmin, foi reivindicada a liberação de recursos para a construção de dois novos piscinões, na região do Jardim União, cujas áreas a Prefeitura já desapropriou, e para a construção de moradias para as pessoas que perderam suas casas.
A prefeitura liberou dois endereços para receber donativos: na Rua Coronel Domingos Ortiz, 499, e no Clube das Acácias. “Estamos precisando de material de higiene pessoal e limpeza (principalmente fraldas descartáveis, tanto infantis quanto geriátricas nos tamanhos P, M e G), colchões, roupa de cama, mamadeiras e brinquedos. Mais informações no telefone 4800-7497.
Estragos causados pelas fortes chuvas que atingiram a cidade de Francisco Morato
Técnicos do Instituto de Pesquisas Tecnológicas (IPT) e da Defesa Civil estão fazendo o mapeamento das áreas de riscos em Mairiporã. Alguns locais identificados são os bairros Parque Náutico, Flor da Bragança, Jardim Carpi, Jardim Henrique Martins, Jardim Fernão Dias, Capoavinha, Jardim Santana Jardim Brilha e Mato Dentro.
Na cidade vizinha, Francisco Morato, a prefeitura informou que 280 pessoas estão desabrigadas e que a grande maioria foi para a casa de parentes ou amigos. Na região, oito pessoas morreram. Durante o dia, comerciantes do centro da cidade ainda limpavam o barro nas calçadas. Em toda a cidade, podem ser vistos vários pontos de queda de barreiras.

Projeto de lei prevê aumento de pena para aborto em caso de microcefalia
O projeto prevê o aumento da pena em um terço até a metade quando o aborto for cometido em razão da microcefalia
Autor do projeto do Estatuto da Família, já aprovado na Câmara dos Deputados, o deputado federal Anderson Ferreira (PR-PE) apresentou outra proposta polêmica à Casa. O projeto aumenta a pena no caso de aborto cometido em razão da microcefalia ou outra anomalia do feto.
Para o deputado, não é o aborto que resolve os problemas da sociedade, mas sim o Estado dar condições para uma vida digna. “Sou autor do projeto Estatuto da Família, que já foi aprovado na Câmara dos Deputados. A intenção foi justamente criar um instrumento para as famílias poderem cobrar e ter acesso às políticas públicas. Quando uma criança nasce tem direito à saúde, educação, segurança, alimentação. Está na Constituição”, diz Ferreira.
O Projeto de Lei 4.396/2016, que altera o artigo 127 do Código Penal, prevê o aumento da pena em um terço até a metade quando o aborto for cometido em razão da microcefalia ou qualquer outra anomalia do feto, provocado ou consentido pela própria gestante ou por terceiros, com ou sem o aval da mulher.
A apresentação do projeto, segundo Ferreira, é uma reação “à tentativa de um movimento feminista, que quer se aproveitar de um momento dramático e de pânico das famílias, para retomar a defesa do aborto em nosso país”. A circulação do vírus Zika no Brasil e a associação da infecção em gestantes a casos de microcefalia em bebês reacendeu no país o debate sobre o aborto. Mas, para o deputado, a melhor forma de evitar o surto de microcefalia é combater o mosquito Aedes aegypti com medidas efetivas e criar mecanismos de prevenção junto à sociedade.
Um grupo composto por advogados, acadêmicos e ativistas prepara uma ação, a ser entregue ao Supremo Tribunal Federal (STF), que cobra o direito de a mulher de interromper a gravidez em casos de infecção pelo vírus Zika. “O que queremos garantir é que haja o acesso ao aborto livre de estigma, combinado ao acesso à informação sobre a infecção e a epidemia, para que as mulheres possam tomar a melhor decisão para si”, disse a antropóloga e pesquisadora Debora Diniz, que está à frente do trabalho.
Segundo ela, a ação está sendo preparada e deve ser proposta em breve, mas os detalhes sobre como seria estruturado o atendimento ao aborto legal nesses casos devem ser definidos pela política pública de saúde, assim como é hoje para as demais situações. O aborto é permitido no Brasil nos casos de anencefalia do feto, estupro ou se a gestante corre risco de vida.
Saiba Mais
Para o deputado Anderson Ferreira, o movimento não leva em conta que o diagnóstico da microcefalia só ocorre do sexto ao oitavo mês de gestação, quando a criança já está formada. “Há vidas em jogo. em vez de querer matar o mosquito, os defensores do aborto querem matar a criança. E acrescentei no projeto outras anomalias porque há vários outros tipos de problemas que afetam os fetos.”
Segundo ele, há vários casos de crianças que nasceram com microcefalia e hoje levam vida normal. “Quem defende aborto nestes casos defende uma seleção de seres humanos, que só tenha direito a nascer quem for perfeito fisicamente.”
A tentativa do deputado é inibir o aborto. “Quis deixar de uma forma clara o crime gravíssimo que são [os abortos] em casos de microcefalia e outras anomalias, por haver ausência deste termo no Código Penal. E para que não haja interpretação nova no STF, justamente pela ausência da clareza”, disse o parlamentar.
Débora Diniz destacou que, além de dar o direito de escolha às gestantes infectadas pelo vírus Zika, a ação no STF vai pedir, para as mães de bebês com deficiência, políticas sociais mais abrangentes, a fim de aumentar o apoio às necessidades de saúde, de educação, de inclusão social das crianças.
Para a antropóloga, o deputado age de má-fé ao propor aumentar a pena para aborto em caso de “qualquer outra anomalia do feto”. “O projeto de lei ignora deliberadamente o direito ao aborto legal em caso de anencefalia garantido por decisão do STF. O deputado pretende retroceder ainda mais no acesso ao aborto legal sem dizê-lo abertamente. Propostas como essas só evidenciam que o Congresso Nacional não está comprometido com a defesa dos direitos das mulheres. Nós acreditamos que o STF, diferente do Congresso, será capaz de analisar a questão sob a ótica de proteção de direitos, como é sua função”, disse.
Além da maior punição a quem pratica o aborto, o deputado Anderson Ferreira defende que haja a ampliação do Benefício de Prestação Continuada (BPC) para a pessoa com deficiência, para que mais famílias possam ser atendidas pelo programa. Famílias de crianças com microcefalia com renda até um quarto de salário mínimo per capita têm direito ao benefício. Segundo Ferreira, também tramita um projeto na Câmara dos Deputados prevendo indenizações para os casos de microcefalia.
Sobre os casos de mulheres que morrem ao recorrer a clínicas clandestinas para conseguir o aborto, o deputado disse que isso é caso para a polícia.
O Código Penal prevê pena de detenção de um a três anos para a mulher que causar aborto em si mesma ou consentir que outra pessoa provoque a interrupção da gestação. Se o aborto for provocado por terceiros sem o consentimento da gestante, a pena é reclusão de três a dez anos. Se houver consentimento, a pena é reclusão de um a quatro anos.
