por Jurandir Soares
Dentre as propostas apresentadas pelo presidente ucraniano Volodimir Zelensky para acabar com a guerra está uma consulta à população do Donbass, para que esta se manifeste se quer continuar sendo cidadã da Ucrânia ou se quer passar a ser da Rússia. Diante do atual quadro, em que a Rússia não consegue tomar toda a região e a Ucrânia não consegue expulsar as forças russas, parece a proposta mais lógica. Ou seja, o povo da área em disputa estaria manifestando sua vontade.
O russo Vladimir Putin não aceitou a proposta. Essa rejeição coloca por terra as alegações de Moscou de que aquela área pertence à Rússia e de que a população que ali vive é de origem russa. Se Putin e seus asseclas tivessem convicção de suas alegações, não iriam rejeitar o plebiscito, pois teriam uma vitória certa.
PRECEDENTE
Putin diz que aceita a criação de uma “zona tampão” entre as partes ocupadas pela Rússia e o território ucraniano. Ou seja, com isso já veria como parte da Rússia as áreas que ocupa. O território é composto pelas províncias de Lugansk, toda ocupada por Moscou, e Donetsk, que ainda tem cerca de 20% sob controle de Kiev.
Outra preciosidade de Putin é impor que a zona desmilitarizada fique sob o controle da Guarda Nacional russa. Ora, se é desmilitarizada, não pode ficar força nenhuma ali. Ou fica uma força neutra, de preferência designada pela ONU, como tem acontecido em várias partes do mundo. Mas esta é mais uma artimanha de Moscou.
OBJETIVO
Uma vez ocupando essas áreas, Putin já terá alcançado parte de seu objetivo. E este fato deve servir de alerta para os vizinhos da Ucrânia. Abriu-se um precedente. E, como teme Kiev e seus aliados da União Europeia, Putin terá concretizado o primeiro passo de sua pretensão expansionista. É sempre importante lembrar que ele é “uma viúva” da União Soviética. Vive repetindo que acabar com a mesma foi um dos maiores erros históricos. Ou seja, fica claro que sua pretensão é ter de novo um grupo de países sob o domínio russo.
Acontece que a maior parte dos países que até 1989 orbitavam em torno de Moscou passou a fazer parte da União Europeia e até mesmo da Otan. Países que eram estagnados, como Romênia, Hungria, Polônia, Tchéquia, Eslováquia, Bulgária e outros, hoje desfrutam de situação privilegiada, gozando das benesses do capitalismo e das vantagens de fazer parte da Comunidade Europeia.
CONTRA
E justo essa União Europeia não está engolindo a força que Donald Trump vem fazendo para que a guerra termine com a concessão territorial por parte da Ucrânia. Os europeus não só querem continuar dando respaldo militar a Kiev, como vão decidir na semana que vem um ponto sensível no seu embate com a Rússia: o uso de quantia equivalente a R$ 1,3 trilhão em reservas de Moscou, congeladas por sanções no continente, a maior parte na Bélgica. Há diversas resistências políticas e técnicas à ideia, chamada de roubo pelo Kremlin. Querem usar esses recursos para a reconstrução da Ucrânia. Só que não adianta falar em reconstrução quando a guerra ainda continua.
ENTREGA
O fato é que, na sua obstinação em ganhar o Prêmio Nobel da Paz, o presidente Trump quer se ufanar de ter terminado com a guerra na Ucrânia. Mesmo que, para isso, entregue os territórios ucranianos de “mão beijada” para Putin, com vistas até mesmo a um butim em termos de minerais, depois que os russos tomarem conta de tudo.
Fica claro que, com Trump, se estabeleceu uma dessintonia entre Estados Unidos e Europa. Aliás, os europeus estão cada vez mais convictos de que precisam reforçar suas forças armadas, para não ficar na dependência de Trump. E convictos também de que, em algum momento, terão de se defrontar numa guerra com a Rússia.
Correio do Povo
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