A escancarada trama realizada no julgamento pelo Senado Federal da ação de responsabilidade impetrada contra a então Presidente Dilma Rousseff, cujo escandaloso resultado foi o chamado “fatiamento” da condenação, resultando na confirmação do afastamento de Dilma e na questionada manutenção dos seus direitos políticos para exercer a função pública, contrariando (”fatiando”)o disposto no parágrafo único do artigo 52 da CF, merece total repúdio da sociedade civil, especialmente das entidades públicas e privadas responsáveis pela preservação do Estado de Direito, como os órgãos de classe da Magistratura, do Ministério Público e da própria Ordem dos Advogados do Brasil, todos em silêncio sepulcral até agora.
Os motivos dessa “heresia” política, jurídica e moral, tudo ao mesmo tempo, já foram expostos na mídia quase à exaustão, e com soberba maestria, não restando qualquer dúvida sobre a flagrante irregularidade da manutenção dos direitos de Dilma para exercer a função pública durante os próximos 8 (oito) anos.
Todavia “escapou” dessas abordagens ,mesmo da mais atenta e imparcial, uma questão fundamental. Por um lado, o Senado não é nenhum TRIBUNAL CONSTITUCIONAL , competente para interpretar a Constituição, que é da exclusiva alçada do Supremo Tribunal Federal. O Senado não tem essa competência , mesmo quando julga ação de responsabilidade contra presidentes da república. Mas foi exatamente isso o que fizeram no julgamento de Dilma Rousseff, incrivelmente numa seção presidida por Sua Excelência o Sr. Presidente do STF, Dr. Ricardo Lewandowski, que não só permitiu essa manobra ilícita ,como dela foi o principal artífice.
O que fez, então ,o Senado? Deu pela procedência do impeachment, pela maioria exigida na Constituição (+ de 2/3),porém com uma “ressalva” absurda. O tal “fatiamento” da condenação da “ré” significou sem qualquer dúvida uma MODIFICAÇÃO da Constituição, alterando o seu artigo 52,parágrafo único.
Sintetizando, pode-se afirmar sem medo de erro que o Senado atribuiu a si mesmo, autoproclamando-se nessa condição, a qualidade de PODER CONSTITUINTE DERIVADO REFORMADOR, sem que tenha havido a instalação do devido processo legal ordenado na Constituição.
Agindo debaixo da “saia” do Presidente do STF, que foi parte essencial desse conluio vergonhoso, e talvez o principal responsável por esse “golpe” contra a Constituição, essa Casa Legislativa achou-se no direito - debaixo da aludida “saia”- de alterar a constituição a seu bel prazer, fora dos trâmites constitucionais de Proposta de Emenda à Constituição-PEC. Mas imperioso é ressaltar que a matéria em discussão não estaria obstaculizada de deliberação em PEC,em tese, por não estar sujeita às restrições contidas no artigo 59,I,da CF, que veda emenda à constituição nas matérias ali elencadas. São as tais “cláusulas pétreas”, não sujeitas à emendas constitucionais.
Essa alteração na Constituição , feita irregularmente e “por baixo-dos-panos”, pelo Senado, para “minimizar” a pena de Dilma, poderia sim ter sido feita ANTES, através de uma PEC regularmente processada, ,que seria o instrumento jurídico e político apropriado, e não como foi feito ,”na marra”, num conluio, numa trama, fora dos ditames constitucionais.
Tudo leva a crer que esse ilícito cometido no julgamento do impeachment de Dilma não só infringe claro dispositivo constitucional, como também poderia certamente configurar “crime” cometido em “quadrilha”,até mesmo de “responsabilidade”,e mesmo enquadrável em algum dispositivo do Código Penal como crime “comum” Mas essa seria uma possibilidade condicionada à existência de uma Justiça onde os seus órgãos superiores não estivessem comprometidos com a bandalheira política reinante e, ao mesmo tempo ,da existência de alguma instituição com coragem suficiente e competência para provocar a questão ,política ou judicialmente. Mas a grande dificuldade para que se fizesse essa JUSTIÇA é que as instituições - justamente as competentes para provocar e apreciar demandas desse tipo - não só se consideram acima da lei, como também se “acham” a própria lei, moldando-a conforme seus propósitos, mesmo que escusos, características principais que marcam as tiranias.
Trocando tudo em miúdos, a conclusão lógica é de que aqueles que estão acusando que o processo de impeachment contra Dilma teria sido um “golpe”, vendendo essa mentirosa versão para a mídia internacional, é que em última análise são os verdadeiros GOLPISTAS.
A maior prova está no resultado do impeachment, em que Dilma simplesmente não foi “expulsa” da vida pública durante os oito anos, como manda a Constituição (art.52,parágrafo primeiro), porém parcialmente “suspensa” ,inclusive podendo voltar a ocupar a presidência dentro de dois anos ,bem como exercer qualquer função pública,( claro que sem concurso público), desde já, possibilidade que na primeira hipótese não poderia ser descartada ante a realidade de uma democracia totalmente deturpada (OCLOCRACIA),onde a tendência geralmente é a opção pelo “pior”, devido ao processo de idiotização política a que foi submetido o povo brasileiro durante toda a sua história, profundamente agravado na era do PT e dos seus aliados ,não se “absolvendo” o PMDB, em vista da sua parcial mudança de atitude nos últimos meses, considerando ter sido esse partido o mais robusto comparsa do PT durante os seus treze anos de desgoverno, e também de ter sido o principal coadjuvante do “golpe” dado agora na Constituição ,presidido por Lewandowski, favorecendo a “companheira”Dilma.
Sérgio Alves de Oliveira
Advogado e Sociólogo
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